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quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

2015, o ano que pode surpreender

Uma frente de esquerda, formada pelos principais movimentos sociais, liderada, entre outros, pelo dirigente do MTST, Guilherme Boulos, está em construção.

por: Saul Leblon

Postado: Carta Maior

Poisse da Dilma

A palavra   incerteza  comanda a passagem de 2014 para o Brasil de 2015, mas o chão mole do calendário político registra agora uma auspiciosa pavimentação de terra firme que pode surpreender.
Uma frente de esquerda formada pelos principais movimentos sociais  brasileiros,  tendo à frente, entre outros, o dirigente do MTST, Guilherme Boulos, está em formação no país.
Não é ainda a alavanca capaz de reverter a ofensiva conservadora em marcha batida na sociedade. Mas tem potência para isso.
Tem, sobretudo, capacidade para sacudir uma correlação de forças na qual as elites mastigam a margem de manobra do  segundo governo Dilma entre os dentes da fatalidade econômica e do engessamento político.
A iniciativa dos movimento sociais, apoiada por partidos de esquerda, conta com um incentivo sintomático  da gravidade dos dias que correm: o do ex-presidente Lula e, portanto, de uma parte significativa do PT.
Tem, ademais, um precedente revelador.
Ela vem se somar a uma mobilização equivalente, iniciada há cerca de um mês, para reaproximar intelectuais de esquerda  e construir um contraponto de ideias progressistas ao agendamento conservador da sociedade, martelado diuturnamente pelo jogral midiático.
Trata-se de uma usina de respostas à espiral regressiva; uma caixa de ressonância de intelectuais cidadãos.
Esse polo de debate e combate foi oficializado no dia 15 de dezembro, em evento em São Paulo, com o nome de Fórum 21.
A primeira assembleia, no Sindicato dos Engenheiros, elegeu como uma de suas vértebras a luta pela democratização dos meios de comunicação.
Presente no lançamento, o secretário de Cultura da Prefeitura de São Paulo, Juca Ferreira, afirmou que os meios de comunicação são o principal obstáculo ao debate crítico dos reais desafios brasileiros.
‘Precisamos iniciar uma reconstrução programática que supere nosso próprio desgaste, mas essa tarefa requer um ambiente midiático oposto ao atual,  concentrado e carente de regras democráticas’, disse Ferreira.  (leia  ‘Para Juca Ferreira, falta de democracia da mídia substituiu censura do regime militar’, nesta pág).
A importância descomunal da imprensa na luta política não é assunto estranho à reflexão intelectual  desde que Gramsci (1891-1936) o incorporou a sua obra.
Na Itália, a fragilidade das estruturas partidárias, ao lado das dificuldades impostas por uma unificação feita de instituições ralas e abismos sociais e regionais profundos, fez com que os jornais assumissem funções de verdadeiros partidos, ensinou o pensador comunista.
As semelhanças meridionais com o subdesenvolvimento tropical não são negligenciáveis.
Nos anos 90, Celso Furtado costumava explicar pacientemente aos jovens jornalistas – os poucos que ainda procuravam o grande economista brasileiro taxado de jurássico pela emergente agenda tucana— que o ‘populismo’, ao contrário da demonização que lhe atribuíam as elites, refletia o vácuo histórico de uma sociedade pouco sedimentada institucionalmente, capturada pelas mandíbulas de um capitalismo de fronteiras indivisas.
O Estado e os líderes carismáticos compensavam o oco político falando direto às massas. E intervindo na economia para organizar a luta contra o subdesenvolvimento.
A colisão entre esse improviso de poder popular e o diretório midiático gerou entre nós alguns capítulos pedagógicos.
O suicídio de Vargas foi um deles.
O criador da igualmente por isso maldita Petrobras apertou o gatilho para não ceder à pressão insuportável do denuncismo lacerdista, que exigia sua renúncia em emissões sistemáticas através da rádio Globo, dirigida então pelo jovem udenista Roberto Marinho.
O Brasil era descrito como um mar de lama.
É dispensável enfatizar as semelhanças com a pauta e os métodos abraçados agora pelos grandes veículos de mídia em sintonia com a oposição conservadora ao governo Dilma, ao PT e ao ‘lulopopulismo’ econômico.
O Fórum dos intelectuais  e a frente de movimentos sociais  emergem como o contraponto mais importante a isso, desde a vitória de Dilma em 26 de outubro.
O conservadorismo atordoa o discernimento da sociedade desde então com uma escalada vertiginosa de iniciativas.
Habilidosamente, equipara-se combate à corrupção à demonização do polo progressista, no qual se espeta o selo da degeneração política, associada a práticas econômicas ‘intervencionistas’.
A ideia de uma salubridade externa à história, tomada como referência limpa e boa na construção da sociedade, é um daqueles mantras aos quais se agarram os interesses dominantes de todos os tempos.
A depender da conveniência, essa salubridade poderá vestir a toga da judicialização da ‘má política’. Ou a gravata técnica dos centuriões que falam em nome da proficiência dos mercados para dar o rumo ‘correto’ à economia.
Ou ainda encarnar no monopólio de um dispositivo midiático que se avoca a prerrogativa de um Bonaparte, a emitir interditos e sanções em defesa dos interesses particulares apresentados como os de toda a nação.
Hoje, o objetivo desse aluvião é o impeachment de Dilma ou o sangramento irreversível de seu governo, e das forças que o apoiam, bem como das ideias que as expressam. Até o seu sepultamento histórico em 2018.
Semanas após a vitória progressista nas urnas, quando o governo parecia hipnotizado pelo serpentário golpista que havia subestimado,  e por isso não se preparado para defender o escrutínio popular, Carta Maior indagava:
‘O que se pergunta ansiosamente é se  Lula já conversou sobre isso com Boulos, do MTST; se Boulos já conversou com Luciana Genro; se Luciana Genro já conversou com a CUT ; se a CUT já conversou com Stédile; se todos  já se deram conta de que passa da hora de uma conversa limada de sectarismos e protelações, mas encharcada das providencias que a urgência revela quando se pensa grande. Se ainda não se aperceberam da contagem regressiva que ameaça o nascimento de um Brasil emancipado e progressista poderão ser avisados de forma desastrosa quando o tique taque se esgotar’.
A boa nova na praça é que a conversa começou.
O desafio de vida ou morte consiste agora em restaurar a transparência dos dois campos em confronto na sociedade.
Na aparente neutralidade de certas iniciativas pulsa, na verdade, a rigidez feroz dos interesses estruturais por elas favorecidos.
O melhor solvente para essa tintura é a ampla participação popular no debate e nas decisões que vão definir a rota do futuro brasileiro.
O país, desde 2003, e com todas as limitações e contradições intrínsecas a um governo de base heterogênea-- tem figurado aos olhos do mundo como uma das estacas da resistência latino-americana à retroescavadeira ortodoxa, que demole e soterra direitos sociais e soberania econômica urbi et orbi.
Essa resistência criou um dos maiores mercados de massa do planeta em uma demografia de 202 milhões de habitantes.
O assoalho macroeconômico range e ruge  sob o peso da inadequação entre a emergência dessa nova força motriz  e as estruturas rigidamente pensadas para exclui-la do mercado e da cidadania.
A solução da 'agenda técnica’ é higienizar a sujeira do intervencionismo público em todas as frentes, devolvendo o mando do jogo à faxina  autorreguladora  dos mercados.
Sobrepor o interesse privado aos da sociedade implica capturar o sistema democrático integralmente para esse fim.
Era esse o objetivo dos candidatos conservadores derrotados em outubro.
Não era apenas uma disputa presidencial. Mas um capítulo do embate inconcluso pelo comando do desenvolvimento brasileiro.
Daí a ilusão de se supor que concessões pontuais vão saciar o agendamento derrotado nas urnas.
Não será a adoção homeopática de sua farmacopeia que o fará recuar.
O discernimento daquilo pelo que se luta, e contra quem se travará a batalha dos próximos dias e noites, é crucial para os interesses populares afrontarem a avalanche em curso.
Essa é uma batalha entre a democracia social e as forças regressivas que se insurgiram contra a sua construção em 32, 54, 64, 2005, 2006, 2010 e 2014.
Tornar esse divisor visível aos olhos da população requer um símbolo de magnetismo equivalente à dimensão das tarefas que essa agenda encerra em termos de organização e  repactuação do país com o seu desenvolvimento.
Requer o nascimento de uma frente  de esquerda que, à semelhança do ‘Podemos’, na Espanha, guarde incontrastável vinculação com as urgências populares. Mas também  encerre um denso discernimento das contingencias globais, que não podem ser abduzidas pelo imediatismo corporativista.
Embora o martelete midiático tenha disseminado a bandeira do antipetismo bélico, a ponto de hoje contagiar setores amplos da classe média, o fato é que esse trunfo conservador  ainda não reúne a energia necessária para  inaugurar  uma nova ordem.
O pântano, por enquanto, o satisfaz.
Ele desarma a sociedade e  exaspera a cidadania.
Dissemina um sentimento de impotência diante das urgências de uma  transição de ciclo econômico marcada por uma correlação de forças  instável,  desprovida de aderência institucional , ademais de submetida à determinação de um  capitalismo global  avesso a qualquer  outro ordenamento  que não  o vale tudo dos mercados.
A força e o consentimento necessários para conduzir  esse  ciclo em uma chave que não seja a do arrocho requisitam o salto de articulação social que agora se ensaia.
O caminho oposto é o da treva.
A regressividade conservadora predominante na Itália após o ‘Mãos Limpas’, nos anos 90, não é uma miragem; é um risco real em sociedades desprovidas de representação política forte e organização social mobilizada (leia ‘Mãos Limpas; e depois, Berlusconi?’; nesta pág).
Lá como aqui o lubrificante do retrocesso foi a prostração progressista e a incapacidade da esquerda e dos democratas de construir um repto histórico de esperança para engajar a sociedade no comando do seu destino.
A gravidade dos desafios embutidos no calendário de 2015 é de ordem equivalente.
Saber onde estão as respostas e reunir a energia política capaz de validá-las é trunfo valioso.
É esse o significado encorajador da nascente frente de esquerda dos movimentos sociais e da usina de intelectuais cidadãos reunidos no Fórum 21.
São sinais de um aggiornamento em curso na vida política nacional.
Mas que já extrapolam a mera formalidade da travessia gregoriana, para emprestar a 2015 a dimensão e o desassombro de uma verdadeira renovação histórica.

domingo, 28 de dezembro de 2014

1º GRANDE ATO CONRA A TARIFA

aumento das passagens

 https://www.facebook.com/events/333242993533459/ O prefeito Fernando Haddad já confirmou que a tarifa de ônibus em São Paulo vai aumentar no início de janeiro. O governador Geraldo Alckmin,por sua vez, afirmou que as passagens do Metrô e da CPTM devem subir junto. Movimentar-se pela cidade, algo pelo qual não deveríamos ter que pagar, agora vai custar R$ 3,50 - e pra quem pega metrô e ônibus, vai para R$ 5,45. Cada vez que a tarifa sobe, aumenta o número de pessoas excluídas do transporte coletivo. Com menos gente circulando, novos aumentos serão necessários, numa espiral que diminui cada vez mais o direito à cidade da população. Entre nós e a cidade (que nós mesmos fazemos funcionar!) existe uma catraca que cobra cada vez mais caro. É que para os de cima, ninguém tem que sair da periferia se não for para trabalhar ou - se tiver dinheiro - para consumir. Além disso, nos obrigam a pagar por ônibus lotados em linhas e trajetos sobre os quais nada decidimos. Por isso convocamos todas e todos para o 1º GRANDE ATO CONTRA A TARIFA, na sexta-feira (09/01), com concentração a partir das 17h em frente ao Teatro Municipal (próximo ao metrô Anhangabaú e do terminal Bandeira). Na mesma semana, na segunda-feira (05/01), realizaremos uma aula pública contra a tarifa em frente à prefeitura da cidade (se é que alguém ali ainda quer aprender alguma coisa). Como sempre, a prefeitura alega que o aumento é inferior à inflação do período. Mas um direito pode ser medido pela inflação? O direito de se locomover não deve ter preço. Transporte não é mercadoria! Cobrar pelo transporte – que deveria ser público de verdade – e ainda aumentar esse preço é uma escolha política pela exclusão de pessoas e em favor do lucro dos empresários de ônibus. Este aumento soa mais absurdo quando constatamos que uma auditoria acaba de provar que milhões foram desviados pelas empresas do transporte. Reduzir seu lucro exorbitante e cobrar o dinheiro roubado seria suficiente para manter o preço da tarifa ou até mesmo reduzi-la. O passe livre estudantil anunciado pela prefeitura é uma conquista da luta do povo, que foi às ruas em 2013. Mas não é Tarifa Zero! A medida ainda está longe do que é fundamental: enquanto o transporte continuar sendo tratado como mercadoria e enquanto houver tarifa e aumentos, haverá luta da população, se organizando e resistindo em cada canto da cidade! Não aceitaremos nenhum centavo a mais! Agora é de R$ 3 para baixo, até zerar! A luta segue até tarifa zero para TODAS E TODOS! CONTRA A TARIFA! +info: http://saopaulo.mpl.org.br/…/convocatoria-primeiro-grande-…/

Passe Livre São Paulo

quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

Dilma afirma que vai privatizar parte da Caixa

24 de Dezembro de 2014
SEEB de Santos e Região - Postado por Carlos Roberto kaká
Nova equipe econômica objetiva abrir capital da Caixa e trazer mais miséria ao País

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A presidente Dilma (eleita pelas forças partidárias de esquerda, os movimentos sindicais e sociais deste país) deu mais uma guinada à direita e tem como objetivo privatizar parte da Caixa da Econômica Federal, abrindo o capital do banco na bolsa de valores, como faria Aécio Neves. O Sindicato dos Bancários de Santos e Região, filiado à Intersindical-Central da Classe Trabalhadora, repudia com veemência a abertura do capital do maior banco público da América Latina.

A Intersindical e a diretoria do Sindicato sempre estiveram engajadas para que os bancos públicos como a Caixa e Banco do Brasil façam seu papel social atuando na promoção da cidadania e do desenvolvimento sustentável do País, como instituição financeira, agente de políticas públicas e parceira estratégica do Estado brasileiro. É um crime empurrar o banco para o mercado financeiro e privatizá-lo, desviando bilhões do bolso dos trabalhadores para especuladores da bolsa.

“Claro que isso é um dos objetivos do ex-banqueiro do Bradesco e novo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que está defendendo os interesses do mercado financeiro e não dos trabalhadores”, realça Ricardo Saraiva Big, Presidente do Sindicato dos Bancários de Santos e Região e Secretário de Relações Internacionais da Intersindical.

Vejam no que os especuladores vão colocar as mãos se houver a abertura do capital: a Caixa patrocina o Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (FIES). Repassa recursos das loterias para projetos sociais e instituições subordinadas ao Governo federal atuando na área de esportes, seguridade social, educação, cultura e segurança penitenciária.

O banco centraliza operações como o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), Programa de Integração Social (PIS) e Habitação popular (Programa de Arrendamento Residencial - PAR, Carta de Crédito, FGTS, entre outros). É agente pagador também do Bolsa Família, programa de complementação de renda do Governo Federal e do Seguro-desemprego.

Atua ainda no financiamento de obras públicas, principalmente voltadas para o saneamento básico, destinando recursos a estados e municípios. Também faz a intermediação de verbas do Governo federal destinadas ao setor público. Acima de tudo, a Caixa Econômica Federal é um órgão público controlado pelo Tesouro Nacional da República Federativa do Brasil.

Segundo relatou a nova equipe econômica de Dilma (dia 22/12, à Folha de São Paulo) o projeto seria fazer uma oferta pública inicial de ações (IPO, na sigla em inglês) daqui a um ano e meio aproximadamente, pois antes da operação, o banco teria de passar por um PROCESSO DE SANEAMENTO.

“Vamos continuar lutando contra as privatizações que durante toda a história do Brasil vem levando a população e os trabalhadores para a miséria e para a subserviência ao capital”, avisa Big!

domingo, 21 de dezembro de 2014

Insegurança alimentar cai no Brasil, mas ainda atinge 52 milhões, mostra IBGE

Postado: Brasil de Fato

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Reprodução

Segundo o suplemento de Segurança Alimentar da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) 2013, dos 65,3 milhões de domicílios registrados, 22,6% estavam em situação de insegurança alimentar

21/12/2014

Por Flávia Vilela,

Da Agência Brasil

O número de domicílios em situação de insegurança alimentar no Brasil continua caindo, mas ainda existem cerca de 52 milhões de brasileiros sem acesso diário à comida de qualidade e na quantidade satisfatória. Segundo o suplemento de Segurança Alimentar da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) 2013, divulgado nesta quinta-feira (18) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), dos 65,3 milhões de domicílios registrados, 22,6% estavam em situação de insegurança alimentar. Esse percentual era 29,5% em 2009 e 34,8% em 2004, anos anteriores da pesquisa.

Dos 14,7 milhões de domicílios com algum tipo de insegurança (22,6%), em 9,6 milhões (14,8%) viviam 34,5 milhões de pessoas (17,1%) da população residente em domicílios particulares em situação de segurança alimentar leve. Nesses lares havia a preocupação quanto ao acesso aos alimentos no futuro. Os domicílios com moradores vivendo em situação de insegurança alimentar moderada representavam 4,6% do total. Ao todo 10,3 milhões de pessoas nessa situação ou 5,1% conviviam com limitação de acesso quantitativo aos alimentos. A prevalência de domicílios com pessoas em situação de insegurança alimentar grave era 3,2%. Em números absolutos, 7,2 milhões de pessoas ou 3,6% dos moradores de domicílios particulares reportaram alguma experiência de fome no período investigado. Em 2009, esse percentual era 5% e em 2004, 6,9%.

O estudo mostra também que a prevalência dos três níveis de insegurança alimentar caíram entre 2009 e 2013. O número de famílias em situação de segurança alimentar aumentou cerca de oito pontos percentuais em quatro anos ao alcançar 77,4% dos domicílios em 2013.  Aproximadamente 150 milhões de pessoas tinham acesso regular e permanente a alimentos de qualidade em quantidade suficiente, segundo o estudo.

De acordo com a pesquisa, a área rural concentrava o maior número de domicílios com indivíduos em situação de insegurança alimentar: 35,3% (13,9% moderada ou grave). Na área urbana esse percentual era 20,5% (6,8% moderada ou grave) . Em 2009, o índice foi 43,7% e 29,3% respectivamente. Nos domicílios particulares urbanos em situação de insegurança alimentar moderada ou grave viviam 7,4% da população urbana, enquanto nos domicílios rurais moravam 15,8% da população.

Em relação às regiões do território nacional, o Norte e o Nordeste tinham o maior número de domicílios com pessoas em situação de insegurança alimentar (36,1% e 38,1% respectivamente) no ano passado. Nas demais regiões esse percentual não chegou a 20%. O Sudeste apresentou o menor índice, 14,5%. Norte e Nordeste também concentravam os maiores percentuais de domicílios com pessoas em situação de insegurança alimentar grave (6,7% e 5,6%). No Sul e Sudeste a prevalência ficou em 1,9% e 2,3%.  Por outro lado, entre 2004 e 2013, o incremento mais expressivo do percentual de domicílios com pessoas comendo bem foi identificado no Nordeste (15,5 pontos percentual), com aumento de 46,4% para 61,9%.

O Espírito Santo foi o estado com o maior índice de segurança alimentar (89,65%), seguido por Santa Catarina (88,9%) e São Paulo (88,4%). As unidades da federação com as menores prevalências foram: Maranhão (39,1%) e Piauí (39,1%), onde menos da metade dos domicílios particulares tinham alimentação assegurada, apesar do aumento de 3,6 e 3,3 pontos percentuais. No Nordeste, todos os estados apresentaram taxas inferiores à média nacional (77,4%). Na Região Norte, apenas Rondônia registrou prevalência de segurança alimentar acima da média nacional, 78,4%

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Votação da PEC 215 é cancelada na Câmara e proposta deve ser arquivada

Postado: Brasil de Fato

Viola Jr/Câmara dos Deputados

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Para Sônia Guajajara, coordenadora da Articulação de Povos Indígenas do Brasil (APIB), esta foi a grande vitória de 2014

18/12/2014

Da Redação

A última sessão do ano legislativo na Câmara dos Deputados foi realizada nessa quarta-feira (17) sem a votação do relatório da Proposta de Emenda a Constituição (PEC) 215, que tirava do Judiciário a prerrogativa de demarcar terras indígenas, Unidades de Conservação e Territórios Quilombolas passando-a para o Executivo.

Em uma sessão movimentada, os parlamentares da comissão especial que avaliava a PEC, presidida pelo deputado Afonso Florence (PT-BA), não conseguiram analisar as questões de ordem apresentadas contra o projeto e a sessão foi encerrada. Em casos como esse, o Regimento prevê que o projeto deve ser arquivado pela Casa.

Mobilização

Do lado de fora, mais de 50 índios que passaram o dia protestando comemoraram o seu arquivamento. Sônia Guajajara, coordenadora da Articulação de Povos Indígenas do Brasil (APIB), reforçou a importância da vitória e das mobilizações dos movimentos, organizações e parlamentares contrários a PEC. “Essa foi realmente a vitória de 2014, num momento em que não víamos a possibilidade de vencermos, diante dos votos e das manobras ruralistas”, comemorou.

Apesar de explicar que o regimento da Câmara “determina que os projetos que não passarem por todas as comissões devem ser arquivados no final da legislatura”, Maurício Guetta, advogado do Instituto Sócio Ambiental (ISA), analisa com cautela o ocorido. Para ele, os ruralistas ainda tentarão aprovar propostas contrárias aos direitos indígenas.       

*Com informações do CIMI

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Índios protestam contra votação da PEC 215 na Câmara dos Deputados

Postado: Brasil de Fato

IndiosCamara_GabrielaKorossy

Gabriela Korossy/ Câmara dos Deputados

Polícia legislativa usou gás de pimenta contra líderes indígenas e não deixaram os manifestantes chegarem próximo do Plenário

16/12/2014

Da Redação

Após confusão foi adiada hoje (16) a votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215. Líderes indígenas tentaram ocupar o anexo 2 da Câmara dos Deputados para acompanhar a votação, mas foram impedidos por uma barreira de policiais militares que usaram gás de pimenta para dispersa-los. Segundo informações da Polícia Legislativa, um índio lançou uma flecha que atingiu o pé de um servidor do Ministério Público.
Na semana passada, a bancada ruralista conseguiu fazer uma manobra que quase antecipou da votação sem qualquer debate com os indígenas e os movimentos envolvidos. Assim como hoje, na ocasião a Polícia Federal também foi acionada para não deixar as lideranças chegarem próximo do Plenário.
Arquivamento
A PEC 215 é polêmica, pois retira do Judiciário a premissa de demarcar terras indígenas e passa esse poder ao Legislativo. O Conselho Indigenista Missionário (CIMI) lançou uma carta para ser enviada ao presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves (PMDB - RN) e ao presidente da Comissão Especial que analisa a PEC, Afonso Florence (PT-BA), onde enumera os retrocessos que a proposta pode significar para os índios brasileiros e pede o seu imediato arquivamento.
"É de amplo conhecimento da sociedade que se a prerrogativa da demarcação de terras indígenas, da titulação de territórios quilombolas e da criação de unidades de conservação passar para o Congresso Nacional haverá uma total paralisação na criação destas áreas no Brasil. Além disso, o parecer desta PEC autoriza a revisão das terras indígenas que já estão demarcadas, o que coloca em risco a autonomia e a própria vida de todos os povos indígenas do Brasil", diz trecho da carta que pode ser lida da íntegra aqui.

domingo, 14 de dezembro de 2014

Desfazendo mitos

Postado: Correio da Cidadania

Escrito por Paulo Passarinho

121214_neodesenvolvimentoRecentemente, setores que apoiam o atual governo divulgaram um manifesto onde, com toda razão, se posicionam contrariados com algumas das iniciativas da presidente reeleita. Particularmente, registraram seu descontentamento com a já confirmada nomeação de Joaquim Levy, como futuro ministro da Fazenda, e a possível ida de Kátia Abreu para o Ministério da Agricultura. Para os signatários deste manifesto, durante a última campanha presidencial teria ficado claro que eram dois os projetos em disputa e essas escolhas de Dilma representariam uma vitória, na prática, do projeto que foi derrotado.

Esta ideia da existência de dois projetos em disputa é totalmente questionável e realimenta ilusões sobre o verdadeiro caráter do modelo econômico em curso no Brasil, desde os anos 1990. Mais grave: fortalece a mitificação, promovida pelo lulismo, de um suposto neodesenvolvimentismo, com base, ao menos, em dois graves equívocos.

O primeiro equívoco relaciona-se ao fato – muito palpável – de os resultados apresentados pelos governos pós-2002 terem sido muito diferentes do período em que FHC esteve na presidência da República. A ampliação dos programas de transferência de renda, a ampliação da oferta de empregos, a recuperação do poder de compra do salário mínimo e a expansão do crédito são exemplos de efeitos obtidos ao longo dos anos em que o PT se encontra à frente do governo federal, e que se distinguem como diferenças importantes em relação à era tucana. Contudo, o fato de os efeitos terem sido diferenciados entre esses dois períodos de governo não significa, necessariamente, que tenhamos modelos econômicos ou projetos diferenciados.

O segundo equívoco, mais grave, é de natureza conceitual e procura amparar essa avaliação – sobre alguns efeitos diferenciados entre esses dois períodos de governo – como uma clara evidência da constituição de um novo modelo econômico em curso no país. Esse equívoco vincula-se às visões que defendem que, especialmente a partir do final do primeiro mandato de Lula, assumimos um projeto neodesenvolvimentista, com taxas médias de crescimento da economia superiores ao período de FHC, melhor distribuição de renda e uma política externa “independente”.

O fato de o Brasil ter experimentado uma taxa média de crescimento anual durante os dois mandatos de Lula (4%) superior aos oito anos de governo FHC (2,3%) não é, evidentemente, condição suficiente para a constatação de um novo projeto econômico em curso, mesmo se levarmos em conta uma suposta melhor distribuição de renda no país. O próprio desempenho da economia nesses primeiros quatro anos do governo Dilma mostra, muito bem, que até mesmo sob a ótica do “crescimentismo” vamos muito mal.

No livro Desenvolvimento às Avessas – Verdade, má fé e ilusão no atual modelo brasileiro de desenvolvimento, Reinaldo Gonçalves, professor titular de Economia Internacional da UFRJ, resgata a historiografia econômica e destaca que as raízes do pensamento nacional-desenvolvimentista estão nas ideologias e políticas de desenvolvimento econômico da Grã-Bretanha, nos séculos XVI e XVII; da França, no século XVII; dos Estados Unidos, no final do século XVIII e na primeira metade do século XIX; da Alemanha, no século XIX; e do Japão, do final do século XIX e início do século XX.

Este desenvolvimentismo – genuíno ou original – objetivava a formação de uma sólida base produtiva de capital nacional, baseada no trinômio industrialização substitutiva de importações/intervencionismo estatal/nacionalismo.

Essas experiências desenvolvimentistas se diferem, por sua vez, do chamado nacional-desenvolvimentismo brasileiro, ou latino-americano, baseado nas formulações da escola cepalina. Reinaldo Gonçalves qualifica a nossa experiência desenvolvimentista, entre os anos de 1930 e 1979, como uma “cópia infiel” do nacional-desenvolvimentismo, ainda que ela tenha sido capaz de promover significativas mudanças estruturais, particularmente com a formação de uma economia industrial moderna. Contudo, tal processo de industrialização foi viabilizado com uma forte presença do capital estrangeiro, traço fundamental para o entendimento das limitações desse modelo e sua incapacidade de nos permitir um caminho sustentado para a superação do subdesenvolvimento e da dependência econômica que nos caracteriza.

Lembro essas considerações, pois as mudanças constitucionais, as privatizações, os fundamentos macroeconômicos e as reformas institucionais e administrativas introduzidas no Brasil ao longo dos anos 1990 – nos governos de Collor, Itamar e FHC – foram mantidos e aprofundados nos últimos doze anos. Mudanças que ampliam a desnacionalização do parque produtivo brasileiro, aprofundam nossa regressão industrial, além de submeter e fragilizar o Estado brasileiro às pressões do chamado mercado. Características, portanto, absolutamente distintas de qualquer coisa próxima ao que podemos entender como desenvolvimentismo, original ou plagiado.

Isso não significa que não tenhamos tido mudanças produzidas por necessidades conjunturais, como foi o caso da utilização dos bancos públicos, para a garantia da manutenção do mercado de crédito, na crise que se abriu a partir de 2008. Porém, esse tipo de heterodoxia – sob a ótica liberal – vem sendo aplicada até mesmo na Meca do pensamento ortodoxo, os Estados Unidos, com as suas fabulosas injeções monetárias anticíclicas, diretas aos bancos e instituições financeiras privadas.

A apologia, portanto, da existência de um suposto neodesenvolvimentismo no Brasil atual é apenas mais uma construção ideológica que confunde, deseduca e desarma os setores progressistas da sociedade, contra a reforçada hegemonia dos bancos e multinacionais, os maiores defensores e beneficiários deste modelo.


 

Paulo Passarinho é economista

sábado, 13 de dezembro de 2014

O canto das sereias

 

Postado: Brasil de Fato

Haja o que houver, estamos em mãos do mais despudorado fisiologismo, cujos discursos sobrevoam eloquentemente as práticas do clientelismo e do compadrio. Se o mundo gira e a Lusitana roda, os governos se sucedem e o PMDB impera

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Frei Betto

Ei-lo: o Partido do Movimento Democrático Brasileiro à frente das duas casas congressuais: o Senado (Renan Calheiros) e a Câmara dos Deputados (Eduardo Cunha?). Nem na Roma antiga, republicana, tal fenômeno parecia possível. Em nome da divisão de poderes, as famílias nobres cultuavam a diversidade como antídoto ao absolutismo. Aqui não; a cobra fuma e não expira.

O PMDB terá, a partir de 2015, uma bancada de 19 senadores,  66 deputados federais, e governará 7 estados. De fato, é um partido repartido em tendências inclusive antagônicas. Nele há de tudo, desde o testemunho ético de um Pedro Simon às recorrentes denúncias de corrupção que historicamente pesam sobre alguns de seus líderes. Ele pratica, mais que a democracia, a demoarquia, originária do verbo gregoarchein, que significa ser o primeiro, estar à frente, no sentido de comandar processos.

Ora, pra que plebiscitos se, há décadas, vivemos no regime parlamentarista? O PMDB exerce a função de primeiro-ministro, o Executivo preside. Ou quem sabe estamos, sem nos dar conta, em plena monarquia! A família peemedebista se sucede nas instâncias do poder com direito a conceder a correligionários e aliados cargos e prebendas.

Não importa que os discursos sejam outros. Na Inglaterra, enquanto o parlamento grita, a rainha reina. Aqui, idem. Haja o que houver, estamos em mãos do mais despudorado fisiologismo, cujos discursos sobrevoam eloquentemente as práticas do clientelismo e do compadrio. Se o mundo gira e a Lusitana roda, os governos se sucedem e o PMDB impera. Hay gobierno, soy a favor, grita a ala dos peemedebistas acostumada a mamar nas tetas da máquina pública...

Coitado do doutor Ulysses Guimarães e toda a sua luta por uma democracia participativa! Conta Homero, na “Odisseia”, que Ulisses encontrou na Ilha das Sereias curiosas criaturas com cabeças e vozes de mulheres, mas com corpos de pássaros que, com doces canções, atraíam marinheiros ao encontro das rochas. Quando o barco se aproximou, uma calmaria se abateu sobre o mar, e a tripulação utilizou os remos. De acordo com as instruções de Circe, Ulisses tampou os ouvidos da tripulação com cera, enquanto ele próprio foi amarrado ao mastro, de modo que pudesse ouvir a canção e passar a salvo pelo perigo. "Aproxime-se Ulisses!", cantavam as Sereias. Ulisses resistiu, mas quantos, a bordo do transgoverno chamado PMDB, são capazes de tapar os ouvidos ao canto das sereias?

Narra ainda Homero que Penélope, fiel esposa, rechaçou todos os pretendentes, até que surgisse um homem capaz de atirar com o arco de Ulisses. Nenhum deles conseguiu. Até o dia em que um mendigo tomou em mãos o arco, retesou-o e, na mesma hora, Penélope reconheceu nele seu amado Ulisses.

A democracia brasileira espera, como Penélope, o dia em que poderá reconhecer sua plenitude na inclusão social daqueles que, hoje, se nos apresentam como o maltrapilho Ulisses.

      *Frei Betto é escritor, autor de “Reinventar a vida” (Vozes), entre outros livros.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Série de protestos denuncia situação dos moradores do entorno da Estrada de Ferro Carajás

Postado: Brasil de Fato

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Divulgação

Acampamento de famílias atingidas pela obra expõe os grandes prejuízos e pede reparação imediata dos danos sofridos

Da Redação
Desde o último domingo (7) ocorrem mobilizações de moradores da cidade de Parauapebas (PA) em protesto contra o poder público e a empresa Vale. Os manifestantes cobram pela reparação dos graves prejuízos que a Estrada de Ferro Carajás traz à comunidade.
Uma das frentes de ação é dos moradores do bairro Nova Vitória, onde mais de 3500 pessoas vivem em 1200 lotes. Eles reivindicam estruturas estatais como hospitais, escolas e iluminação pública e chamam atenção para a contradição de uma comunidade com serviços de infraestrutura tão precários ficar dentro de uma das maiores reservas minerais do planeta, e da cidade com maior o PIB do estado.
Além disso, várias outras famílias atingidas pela obra de duplicação da estrada, que acontece desde 2011, ocuparam os trilhos do trecho ferrovia em Marabá (PA). Moradores do Assentamento Palmares veem a obra chegar cada vez mais perto das famílias acampadas.
Homenageando Joaquim Madeira, que morreu atropelado por um trem da Vale em 2010, nas ações as famílias reivindicam a indenização de todas as vítimas fatais ou lesionadas pelos trens da Vale ou de empresas terceirizadas que passaram dentro do assentamento.
Para diminuir o nível de pobreza em volta de empreendimentos da empresa, uma das pautas é que 1% da Compensação Financeira Pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM) seja destinado às comunidades atingidas em forma de programas da transferência de renda.
Veja a lista completa de reivindicações:
PAUTA DE REIVINDICAÇÃO DO BAIRRO NOVA VITÓRIA
*I – APRESENTAÇÃO*
Nós moradores do Bairro Nova Vitória, mais de 3.500 habitantes, distribuídos em 1.200 lotes conquistados no processo de mobilização na luta pela moradia, sofremos duplamente um processo de marginalização social enquanto comunidade humana.
Por um lado, o Poder Público municipal não reconhece nosso território como parte do território sob gestão do Município e por isso nos deixa as margens de investimentos públicos em áreas que são condições mínimas para a garantia de direitos constitucionais: Educação, Saúde, Saneamento Básico, infraestrutura urbana e políticas sociais que atendam as carências de nossa comunidade.
Por outro, e ai esta grande contradição, somos uma comunidades das mais pobres e desprotegidas de condições dignas de vida, dentro da maior reserva mineral do Planeta, no município que ostenta um dos maiores PIBs*(Produto Interno Bruto*) do País. Ou seja somos pobres e abandonados dentro de um solo que produz uma das maiores riquezas minerais do mundo.
Entendemos, depois de muita espera e esperança, que não podemos esperar sempre mais. Mais um ano. Espera para que passe o inverno ou ainda esperar pelo próximo governo, seja ele municipal, estadual ou federal.
Por isso resolvemos nos mobilizar outra vez, agora com a seguinte proposta de Pauta:
*II- PAUTA *
*1-Infra Estrutura Urbana*
a) Rebaixamento de todas as ruas e pavimentação desta até a obras de duplicação da Rodovia FarukSalmem;
b) Construção de rotatória de acesso a Bairro Nova Vitória
c) Rebaixamento das encostas com projeto de paisagismo frente o Bairro Nova Vitória
d) Imediata eletrificação de todas as ruas do Bairro;
e) Construção de sistema de captação, armazenamento e distribuição de água, assim como sistema de esgoto;
*2- Infraestrutura Social*
a) Construção de Escola de Ensino Fundamental no Bairro;
b) Construção imediata ou aquisição de imóvel para Posto de Saúde
Comunitário;
c) Construção de Espaço Comunitário de Cultura e Lazer
d) Acesso a programas de habitação para reformas, ampliação e construção de casas no Bairro;
e) Ação imediata para geração de emprego e renda (emprego nas empresas e em programas sociais)
f) Programa de capacitação profissional para Mulheres, Jovens e Idosos
g) Construção de Creche Comunitária para atender as demandas do Bairro;
h) Programa de atendimento, proteção e atenção aos adolescentes e jovens (atividades socioeducativas e de geração de renda)
Comissão de Negociação do Bairro Nova Vitória
Pauta Aditiva de Palmares II – Jornada de Mobilização de Dezembro
Acampamento de Resistência “JOAQUIM MADEIRA”
*1-DIREITOS HUMANOS*
- Indenização de todas as vítimas fatais e lesionadas pelos trens da Vale ou por veículos de empresas terceirizadas nas estradas dentro do Assentamento Palmares;
*2 -  ESTRADAS*
- Agilização da pavimentação asfáltica do trecho já certada durante mobilização entre a Vila/Rio Novo, limite com os Mirandas;
- Recuperação da Estrada do Setor da Sede e construção de Ponte bde Concreto;
*3- TRABALHO, RENDA E DIREITOS SOCIAIS*
- Garantia de estabilidade no emprego a todos os trabalhadores da Vale e de suas terceirizadas, até a conclusão de todas as obras dentro, ou que exigem acesso pelo território;
- Acesso a contrato de emprego aos trabalhadores desempregados das áreas no entorno das obras e serviços das mineradoras, como modo de atenuar impactos sócio econômicos provocados pela mineração;
- Projetos de geração de renda (ver proposta da CTERP)
- Instalação ou parceria de um Posto do SINE, adaptado as
condições da comunidade;
- Dedicação de 1% do CEFM para as comunidades atingidas pelos projetos minerais, através de programa de transferência de renda por família, como forma de diminuir a pobreza no entorno desses projetos;
*4- EDUCAÇÃO*
- Construção de do espaço físico da Escola de Ensino Médio adaptadas a habilidades técnicas de acordo com as necessidades de seu Projeto Político e Pedagógico;
*5- AGRICULTURA*
- Ampliação do número de famílias atingidas pelo projeto/convenio com Assentamento Palmares II,
*6- MÉTODO DE NEGOCIAÇÃO*
- Criação de Comissão Triparte composta por: Representantes da Comunidade, Governo Municipal (ou Estadual ou Federal), Empresa Mineradora para discussão, debate, elaboração e acompanhamento de ações combinadas;
*7- FUNDO SOCIAL*
- Criação de Fundo Social orientado para comunidades atingidas, sob controle comunitário, para projetos de desenvolvimento econômico e social, tendo como origem recursos da Fundação Vale;

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Famílias atingidas pela Vale ocupam trilhos da Estrada de Ferro de Carajás

Estados do Brasil: Pará

Postado: Brasil de Fato

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Reprodução

Segundo eles, por contas das obras da duplicação, no período chuvoso ocorrem vários alagamentos que causam grandes prejuízos tanto no que se refere às estruturas como a perda de eletrodomésticos, móveis, colchões e roupas

09/12/2014

Da Redação

Desde domingo (7) várias famílias ocupam os trilhos da Estrada de Ferro Carajás, próximo ao bairro Km 07, em Marabá, na Pará. Os moradores protestam contra vários problemas ocasionados pela duplicação da estrada, iniciada em 2011, como a ampliação de um aterro que fica cada vez mais perto das residências.

Segundo eles, por contas das obras, no período chuvoso ocorrem vários alagamentos que causam grandes prejuízos tanto no que se refere às estruturas como a perda de eletrodomésticos, móveis, colchões e roupas. No mês de novembro, por exemplo, dezenas de moradores já acumulam prejuízos.

Entre outras coisas, as famílias reivindicam maior agilidade no processo de remoção, que inclui a atualização dos laudos, custos sociais, remuneração por perda na renda, e outros; além da imediata limpeza da grota, do pagamento imediato dos prejuízos que as famílias tiveram e a inclusão das famílias da Rua E no programa de remoção assistida.

Procurados, os representantes da defesa civil da Prefeitura Municipal e da Secretaria Municipal de Meio Ambiente estiveram no local e fizeram promessas de resolver a situação. Diante disso, os moradores desocuparam a estrada, mas voltaram a ocupá-la no dia seguinte, quando verificaram que nenhuma providência real fora tomada nem pelas autoridades nem pela Vale. De lá, dizem, só sairão quando suas reivindicações forem atendidas.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Índios tremembés versus projeto Nova Atlântida: destruição em disputa por terras

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Jardson Castro

Adital

Nos últimos 12 anos, a paz e a tranquilidade do povo indígena tremembé, que vive no município de Itapipoca (Estado do Ceará), a 136 quilômetros da capital, Fortaleza, tem sido comprometida por uma tensa e intensa disputa por território, tendo como protagonistas o empreendimento espanhol Nova Atlântida e a comunidade indígena tremembé. De três meses para cá, a disputa trouxe consequências delicadas, incluindo ameaças constantes de invasão, agressão e coação e ocorrências ainda mais graves, como ameaça de morte das lideranças e, recentemente, o incêndio das casas e a destruição das plantações do povo indígena, que resiste e é contra a construção do projeto turístico.

A razão que tem motivado essa intensa luta é o projeto Nova Atlântida, da empresa espanhola Afirma Housing Group, que pretende construir um complexo turístico formado por vários hotéis e campo de golfe. Os índios, por sua vez, compreendem as terras como sendo as raízes que os identificam, pois é ali que se encontram seus antepassados e guardam sua ancestralidade. A área em questão é composta por uma extensão territorial de 3,1 mil hectares de área litorânea com dunas, manguezais, nascentes de água doce e área marinha. É considerado o maior projeto turístico do país, totalizando cerca de 15 bilhões de dólares para a construção de 13 hotéis cinco estrelas, 14 resorts, seis condomínios residenciais e três campos de golfe.

Adriana Carneiro de Castro (Adriana Tremembé), 43 anos de idade, é líder desse povo e concedeu entrevista à Adital, trazendo seu posicionamento com relação aos últimos acontecimentos que têm marcado a vida dos indígenas, retratando a triste divisão que foi trazida para dentro da comunidade tremembé. Ela diz lamentar o fato do empreendimento ter conseguido trazer a discórdia para onde, até então, se vivia em paz e harmonia.

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Adriana Tremembé relata resistência indígena para manter terra ancestral. Foto: Jardson Castro/Adital.

Segundo a liderança, os últimos três meses têm sido de intensa tensão para ela e seu povo, pois representantes do complexo turístico invadiram suas terras por duas vezes seguidas — em setembro e outubro deste ano —, atearam fogo em nas casas e destruíram os cercados que protegiam as plantações. Não bastando, teriam ameaçado de voltar e cortar a cabeça dos líderes.

A líder tremembé fala ainda sobre a forte relação que seu povo tem com a Mãe Terra e com cada ser vivo que ali reside. O empreendimento argumenta que possibilitaria um desenvolvimento econômico para a região, mas, na visão dos tremembés, a preservação de seus antepassados é mais importante do que qualquer possibilidade de ascensão econômica e jamais irão aceitar um projeto que mataria as vidas que ali se encontram.

Adriana retrata a falta que sente da intervenção dos governos para compreenderem a causa do seu povo. "Não é que sejamos contra o desenvolvimento econômico, geração de emprego e renda. Pelo contrário. O fato é que, para nós, não há riqueza maior do que estarmos em harmonia com as terras que guardam nossa história. Se permitirmos a instalação do empreendimento, seremos cúmplices da destruição de muitas vidas que estão ali. Sem falar que, longe dali, nos sentiríamos como peixes fora d’água”, diz ela.

ADITAL - Gostaria que você iniciasse falando sobre quem é Adriana e sua relação com o seu povo.

Adriana Tremembé - Então, meu nome é Adriana Carneiro de Castro, nasci e me criei lá [Praia da Baleia], já tenho 43 anos e, hoje, minha relação com meu povo é de liderança. Somos o povo tremembé, mas o povo tremembé se encontra em três municípios aqui no Ceará: Itapipoca, Acaraú e Itarema. Em nosso caso, fazemos parte dos tremembés de Itapipoca.

ADITAL - Retrate-nos o conflito desde o início, quando começou e as razões que mais têm lhes motivado a estarem resistentes a tudo isso.

AT - Lá no município de Itapipoca, o conflito que estamos vivendo é devido à construção do complexo turístico Nova Atlântida, que é uma construção de hotéis. Essa rede hoteleira vai nos trazer um impacto econômico, seguido de um grande impacto ambiental. Eles queriam que aceitássemos o empreendimento e teriam de nos remanejar de nossas terras para outras terras, para que o empreendimento pudesse se instalar, mas não aceitamos isso, porque ali estão nossas raízes, nossas ancestralidades. Como é que poderíamos sair dali pra irmos para um lugar que a gente não conhece e deixar para trás nosso passado?

ADITAL - Essa proposta de instalação do empreendimento turístico não é recente. Desde quando vocês estão nessa disputa por regularização de suas terras?

AT - Bom, já vinha de alguns anos atrás, mas tudo se intensificou, na verdade, em 2002, quando nós tivemos a coragem de dizer o que éramos, nos assumirmos como indígenas; foi aí que começou o conflito. Até então, nossos pais eram escravos dos posseiros. Para fazer um roçado, tinha de pedir [aos proprietários de terras] e precisávamos passar metade do que era produzido para eles. A partir de 2002, começamos a quebrar isso e sermos independentes deles, foram muitas conquistas, mas também muito sofrimento e muita luta, e nossa resistência tem sido o mais importante no momento. Estamos tentando nos fortalecer, nos unir.

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Área visada para construção de empreendimento turístico. Foto: Reprodução.

ADITAL - Com base no que você trouxe até o momento, as razões que motivam a luta de vocês é o fato de todo o vínculo que vocês têm com suas terras e com seus antepassados. Como você avalia a postura do empreendimento Nova Atlântida?

AT - É claro que eles querem o lucro, porque, para eles, não importa o meio ambiente, não importa o povo que está lá. Para eles, o que importa é o crescimento econômico do empreendimento. Mas, para nós, é diferente; nós temos uma relação direta e intensa com nossa Mãe Terra. Isso é bem mais forte; estarmos relacionados com a natureza, com nossos manguezais, com nossos rios, com nossa terra, com nossas matas e o convívio com cada ser que vive lá. Este é o foco para nós. É maior do que qualquer riqueza financeira e, de maneira alguma, vamos aceitar que alguém venha ferir esse patrimônio que é nosso. Por isso é que estamos sofrendo tudo isso, vivendo em constante ameaça, por sermos uma barreira aos interesses do empreendimento.

ADITAL - Pudemos acompanhar o caso, que foi marcado por alguns momentos de calmaria nessa disputa, mas também por intensa conturbação. Como está a situação do conflito atualmente?

AT - Em 2004, o conflito começou a se acirrar cada vez mais. O empreendimento, nesse período, contratou policiais para invadirem nossas terras, bater e agredir nosso povo, nossas crianças, em nós mulheres. Hoje, nós vivemos um momento bastante difícil, marcado por muita agressividade por parte deles. Desde setembro [de 2014], estamos em conflito intenso, porque fizemos a retomada de um sítio que estava em posse da empresa, onde eles colocaram um capanga para tomar de conta do terreno e nós o expulsamos de lá e, por isso, eles não se conformaram. Dia 10 de setembro, eles invadiram nossa terra e destruíram as palhoças que tínhamos construído, incendiaram todas. Entramos em contato com a Funai [Fundação Nacional do Índio], fomos na delegacia, denunciamos ao Ministério Público, aí deu uma acalmada, mas, depois de um mês, eles vieram novamente com agressividade e destruíram uma casa de alvenaria que estávamos levantando — sem falar das ameaças de morte que nós líderes estamos recebendo constantemente por recado de terceiros.

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Casas e pertences dos tremembés foram destruídos por incêndio criminoso. Foto: Reprodução.

ADITAL - Quando você diz "eles vieram”, a quem você se refere, quem são "eles”, através de quem eles invadem?

AT - O grupo empresarial, através de um advogado chamado Henrique Rocha Trigueira, que se diz representante da empresa, juntamente com os empregados que dão apoio a eles no trabalho sujo. Somos compostos por um total de 230 famílias, mas 100 famílias em nossa aldeia são favoráveis ao empreendimento; então, eles se confrontam com a gente. A empresa chegou a implantar na cabeça dessas famílias que eles devem se confrontar conosco, prometendo emprego e melhoria de vida para eles. Nossa maior preocupação é porque eles conseguiram trazer a discórdia [para] dentro do nosso próprio povo e fizeram com que alguns se voltassem uns contra os outros.

ADITAL - Com tudo isso, como funciona a convivência entre vocês, que são contra o empreendimento, e os grupos que são favoráveis?

AT – Simplesmente, não temos mais uma convivência. Eles vivem nos ameaçando, discordam de tudo que estamos defendendo, eles desmatam a nascente que nós decidimos que iríamos preservar, tudo como forma de provocar algum atrito entre os dois grupos.

ADITAL - Durante esse longo processo de disputa, quantas pessoas são afetadas diretamente com isso? Alguém teve de sair de sua casa, coagida pelo grupo empresarial?

AT - Não, felizmente nós somos bem unidos, essa é a nossa maior força e temos reagido para não sairmos de nossas casas. Hoje, somos 130 famílias reconhecidas pela Funai e temos a assistência deles, nesse sentido.

ADITAL - Qual tem sido o posicionamento dos governos [estadual, municipal e federal] sobre a disputa e como você avalia?

AT - Falando do governo, este é de quem queríamos ter um apoio maior e não temos. Nós sabemos que a relação dos governos não é muito boa com a questão indígena aqui no Ceará, eles não levam a sério a nossa relação com a natureza. Estão mais preocupados, na verdade, com o progresso do município, com a geração de emprego, renda. O atual governador, Cid Gomes [Partido Republicano da Ordem Social – Pros], foi um dos que nos visitou a comunidade e deixou bem claro que não iria nos apoiar, alegando que estávamos sendo contra o progresso e desenvolvimento econômico e que seu governo era o governo do progresso. Mas, ainda assim, queríamos que eles se sensibilizassem e enxergassem nossa relação com nossas raízes e antepassados e que, longe dali, nos sentiríamos como peixes fora d’água.

ADITAL - Como são as condições de vida na comunidade Tremembé? Saúde, educação, emprego, etc.

AT – Lá, nossa vida se resume à agricultura, à pesca e também somos amparados por benefícios sociais, como o Bolsa Família [programa do governo federal para apoiar famílias mais pobres e garantir seu direito à alimentação e o acesso à educação e à saúde]. Hoje, temos uma escola e quase todos os professores são indígenas; então, eles já têm uma fonte de renda para contar. Na saúde, temos quatro pessoas da comunidade inseridas no trabalho com a saúde; então, a gente vai, assim, seguindo.

ADITAL - Como funciona a especulação imobiliária na região da comunidade Tremembé?

AT - Ela é bem forte aqui. Eles visam bastante a essa área porque é uma área muito bonita e bastante cobiçada, de grande extensão litorânea, com encontros de rios com o mar. Temos uma bela paisagem natural e eles enxergam isso como um forte potencial de investimento. Não é que sejamos contra o progresso, como afirmou o governador. Nós somos a favor, sim, mas de um progresso que não destrua nossa natureza, os seres vivos, os mangues, as árvores que ali vivem e, se aceitarmos o empreendimento, seremos cúmplices de toda essa destruição de vida e de nossa paisagem natural.

Tremembés lutam contra empreendimento sem apoio do governo. Foto: Eldem/Jornal A Notícia.

ADITAL - O povo tremembé não é o único que luta por essa causa. Houve algum outro grupo, que você possa citar, que conseguiu a regularização de suas terras? Qual a expectativa de vocês para o processo?

AT – Hoje, ao povo tremembé, existe apenas uma terra demarcada, que é dos tremembés do córrego de João Pereira [entre os municípios de Itarema e Acaraú, Estado do Ceará]. Então, essa terra, hoje, se encontra demarcada e regularizada. O restante das terras indígenas continuam na mesma pendência e eles passam por sofrimentos bem parecidos com os nossos. Nosso processo se encontra em análise, para ser encaminhado ao Ministério da Justiça, analisado e assinado e abrir a portaria demarcatória. Nossa expectativa é que o processo seja finalizado, que tenhamos nossas terras homologadas, demarcadas e regulamentadas, para, assim, podermos viver em paz com nosso povo.

ADITAL - Quais os próximos passos que vocês irão dar?

AT - O nosso próximo passo é continuar na luta pela solução de forma pacífica na justiça, sem atritos. Buscar parcerias e o apoio dos governos e instituições que possam se solidarizarem com nosso caso.

ADITAL - Mais alguma consideração que você queira fazer no sentido dos últimos acontecimentos?

AT - Bom... Hoje, estamos vivendo sobre uma forte tensão, pois estamos sendo constantemente ameaçados por eles, dizendo que irão tirar nossa cabeça fora. Já foram em setembro e destruíram nossas casas, tocaram fogo em tudo, inclusive temos os registros fotográficos, destruíram as cercas que protegem nossas plantações e ameaçam voltar. Então, pedimos às organizações, aos governos e aos direitos humanos que tomem alguma providência que possa nos proteger dessas ameaças, pois sentimos medo de que consequências maiores possam vir e alguém possa sair marcado de maneira mais forte.

Colaborou Marcela Belchior

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Estados Unidos e Brasil: rumo a uma pauta comum

Escrito por Virgilio Arraes

Postado: Correio da Cidadania

031214_brasil_euaTradicionalmente, o discurso oficial norte-americano recomenda aos governos a adoção do livre-comércio. Herdeiro de certa forma da pregação liberal britânica do século 19, o país esposa esta postura em virtude da primazia industrial diante da maior parte do globo, mesmo dos ‘euro-ocidentais’ e japoneses.

Nos poucos segmentos em que não pode superar as demais sociedades, Washington advoga sem restrição alguma a proteção àqueles, sem incomodar-se com a contradição retórica. Após o advento da crise de 2008, a Casa Branca ampliou as medidas restritivas, através de um projeto de lei, a produtos estrangeiros, especialmente ferro e aço – a iniciativa seria denominada de ‘Buy American’.

Em março de 2009, o Brasil registrou sua insatisfação no tocante à nova lei, em reunião entre as duas chancelarias. De todo modo, a crítica teria alcance limitado, dado que na administração estadunidense duas pastas ocupam-se da política exterior: a de Estado, com o componente político, e a de Comércio Exterior, com o econômico naturalmente.

Naquela altura, o Senado não havia ainda aprovado o nome de Ronald Kirk, substituto de Susan Schwab, que deixara o cargo em janeiro do mesmo ano, quando da posse do presidente Barack Obama. Assim, as negociações ficavam na prática suspensas.

Todavia, poucos dias depois do encontro entre o titular do Ministério das Relações Exteriores, Celso Amorim, e a do Departamento de Estado, Hillary Clinton, Kirk seria ratificado quase de forma unânime, porém, sem significar no curto prazo avanço nos debates.

Na pauta política, interessava a Brasília que Washington abrandasse a má vontade em direção a três governos: com Havana, um resquício injustificável da Guerra Fria, seria necessário rever a Lei da Liberdade de Cuba e Solidariedade Democrática – mais conhecida como Helms-Burton - de março de 1996, responsável por robustecer o longevo embargo, ao situar entre a cruz e a espada as corporações exportadoras que deveriam escolher se comerciariam com Cuba ou com os Estados Unidos.

Com Caracas, em decorrência do mal-aventurado socialismo do século 21, e com La Paz, em função de retaliação na importação de têxteis por causa da expulsão de Philip Goldberg, embaixador estadunidense, em setembro de 2008.

Além do mais, a Bolívia defenestraria ao longo de várias semanas todos os agentes do Departamento de Combate às Drogas, algo inédito em um acordo de cooperação bilateral iniciado na década de 70. A medida foi uma resposta ao cancelamento da certificação do país no tocante ao controle das drogas, ainda que não tivesse perdido o auxílio financeiro.

Washington não vislumbrava a exequibilidade da separação entre o cultivo da coca, o terceiro maior do planeta, e a produção da cocaína. Nesse sentido, os servidores expulsos seriam deslocados para áreas fronteiriças com a Bolívia.

Paralelamente ao encaminhamento de problemas de aliados regionais, o Brasil desejava dos Estados Unidos a elaboração de uma política de desenvolvimento para toda a região. Enfim, mais atenção à economia, menos ao policiamento, por conta da preocupação com o narcotráfico.

Naquele momento, o objetivo do Planalto era a eliminação do imposto de importação de pouco mais de 14 centavos de dólar por litro de etanol da cana de açúcar. De maneira involuntária, a aspiração brasileira ia de encontro à venezuelana, dado que podia opor grandes produtores de combustíveis distintos.

Destarte, os norte-americanos ficavam em situação confortável para barganhar com cada um dos dois, sem deixar de lado as implicações políticas desta movimentação.

Virgílio Arraes é doutor em História das Relações Internacionais pela Universidade de Brasília e professor colaborador do Instituto de Relações Internacionais da mesma instituição.

domingo, 30 de novembro de 2014

Crise hídrica de São Paulo passa pelo agronegócio, desperdício e privatização da água

Escrito por Gabriel Brito e Paulo Silva Junior, da Redação

Correio da Cidadania

Áudio da entrevista

101114_secaspPara muitos, o racionamento de água em São Paulo já é uma realidade líquida e certa. Resta saber até quando políticos ganharão tempo para escondê-la ou se a população agirá, a ponto de, quem sabe, se repetirem as chamadas ‘guerras da água’, já vistas em locais onde os serviços hídricos e sanitários foram privatizados. De toda forma, o assunto não é passageiro e exige toda uma reflexão a respeito dos atuais modelos de vida e economia.

“Em primeiro lugar, é preciso reeducar a população a reduzir o consumo. As empresas também, pois quando se fala em redução de consumo parece que só a população consome. Mas, no Brasil, 70% da água é consumida pela agricultura, 22%, pela indústria e 8%, pelas residências. E quando se fala em redução de consumo, só se fala dos 8%, mas não dos 92%”, afirmou Marzeni Pereira, tecnólogo em saneamento da Sabesp, em entrevista ao Correio da Cidadania.

Na conversa, Marzeni elenca uma série de razões históricas, desde as locais até as mais abrangentes, que levaram São Paulo à atual crise hídrica, cujas consequências ainda não foram quantificadas. Trata-se de mais um fracasso do modelo de gestão privatista, de mãos dadas com um projeto desenvolvimentista que tem gerado mudanças ambientais em todos os grandes biomas do país.

“A Sabesp é a empresa mais preparada do Brasil para gerir o sistema de saneamento. Tem o melhor corpo técnico, a melhor estrutura etc. O problema principal é justamente a administração voltada ao mercado e ao lucro. Além disso, a empresa, sem dúvida, vem sofrendo sucateamento. Em 2004, tinha 18 mil trabalhadores e sua base de atuação era menor. Hoje, a empresa tem menos de 14 mil. A terceirização é um dos principais problemas, por exemplo, na perda de água”, explicou, em relação ao contexto paulista.

Por outro lado, Marzeni não deixou de fora toda a relação com um modelo já há décadas hegemônico. “No ano passado, em torno somente de soja, carne, milho e café, o Brasil exportou cerca de 200 bilhões de m³ de água. Significa abastecer São Paulo por quase 100 anos. A umidade atmosférica, mantida através dos chamados ‘rios voadores’, que vêm do Norte do Brasil e precisam da continuidade da vegetação, foi reduzida. A atuação do agronegócio, quem mais desmata, teve influência em SP. E teve também o desmatamento de todo o centro-oeste do estado”, resumiu.

A entrevista completa com Marzeni Pereira, realizada nos estúdios da webrádio Central3, pode ser lida a seguir.

Correio da Cidadania: Qual o resumo que você faz, num breve histórico, das origens e razões da crise da água no estado de São Paulo?

Marzeni Pereira: Podemos dizer que o histórico da crise de água em São Paulo tem bastante tempo. Em 2003, por exemplo, o sistema Cantareira chegou próximo de zero, com menos de 5% de sua capacidade de armazenamento e todo o sistema de saneamento quase entrou em colapso. Houve um princípio de racionamento, com a Operação Pajé (na qual se bombardeavam nuvens e se pulverizava sua água).

Nesse período, foi elaborado um plano para que o saneamento de São Paulo dependesse menos do Cantareira, ao ser assinada uma outorga com vistas a reduzir a dependência do reservatório – o que mais abastece a capital e a região metropolitana. De lá pra cá, a ideia era reduzir perdas, aumentar o reuso e encontrar novas formas de abastecimento, por outros mananciais. Isso não aconteceu.

Em 2004 e 2005, houve uma recuperação da reservação de água; em 2009, houve um pico, com quase 100% das represas cheias. Em 2009, houve um período de enchentes, como a do Jardim Pantanal (zona leste); e em 2011, teve a enchente de Franco da Rocha, por conta da abertura da represa Paiva Castro. Mas, de toda forma, não houve redução da participação do sistema Cantareira. As perdas caíram, mas não o suficiente para suprir a demanda, que cresceu. Não houve, portanto, contrapartida suficiente na disponibilidade de água. Esse é o principal problema.

Outro ponto é que tivemos, recentemente, em 2013 e 2014, uma estiagem bastante forte, apesar de curta, comparando com outras regiões do Brasil, com 5 ou 10 anos de estiagem. Aqui são menos de dois anos, de modo que não era pra estarmos na atual situação.

Neste ano, também teve outro problema: com eleições e Copa do Mundo, havia a necessidade de o governo manter sua imagem em alta. Por isso, não se tomaram medidas para reduzir o consumo de água a partir de janeiro e fevereiro de 2014.

Correio da Cidadania: Qual o papel da Sabesp, com seu modelo de gestão, nesse processo?

Marzeni Pereira: A Sabesp é a empresa mais preparada do Brasil para gerir o sistema de saneamento. Tem o melhor corpo técnico, a melhor estrutura etc. O problema principal é justamente a administração voltada ao mercado e ao lucro. Outra coisa é a dependência das influências diretas do governador e dos acionistas privados.

Além disso, a empresa, sem dúvida, vem sofrendo sucateamento e redução da sua capacidade de trabalho. Em 2004, a Sabesp tinha 18 mil trabalhadores e sua base de atuação era menor. Hoje, a empresa tem menos de 14 mil, uma redução de cerca de 20% do quadro. Isso influencia, certamente.

Outra coisa é que, a partir do momento em que se reduz o número de trabalhadores diretos, há a necessidade de terceirizar serviços. A terceirização é um dos principais problemas, por exemplo, na perda de água. Porque o serviço é mal feito, o cara faz num dia e no outro dia já vaza de novo... Significa que o serviço tem de ser feito várias vezes, e aí temos mais perdas.

É uma lógica adotada nos últimos 20 anos: a empresa depender de outras empresas privadas. Hoje, as empresas privadas têm muita influência no dia a dia da Sabesp. Portanto, é claro que o modelo de gestão tem tudo a ver com a crise.

Correio da Cidadania: Como dimensiona a crise da água no país como um todo, em si e relativamente a São Paulo? Em que medida a destruição dos biomas do Cerrado e amazônico explicam a grave situação que vivemos?

Marzeni Pereira: A estiagem em São Paulo, com certeza, tem relação com o desmatamento da Amazônia e do Cerrado. Obviamente, sempre que há desmatamento se reduz a evaporação de água pela evapotranspiração das árvores. O Cerrado brasileiro sofreu muito com a devastação promovida pelo agronegócio.

Para se ter ideia, no ano passado, em torno somente de quatro produtos (soja, carne, milho e café), o Brasil exportou cerca de 200 bilhões de metros cúbicos de água. Não produziu, apenas exportou, ‘água virtual’, como se diz. Tal número significa abastecer São Paulo por quase 100 anos, apenas com a quantidade de água gasta por esses quatro produtos.

Outro problema é que houve redução da quantidade de água superficial. À medida que há uma degradação, tanto pela remoção da vegetação como pela irrigação intensiva de larga escala, reduzem-se os afluentes dos grandes rios, como os amazônicos e o São Francisco, que já está sofrendo muito com a redução da água.

A umidade atmosférica, mantida através dos chamados “rios voadores”, que vêm do Norte do Brasil e precisam da continuidade da vegetação, foi reduzida. A atuação do agronegócio, quem mais desmata no Brasil, teve influência em São Paulo.

Mas não é só isso. Teve também o desmatamento de todo o centro-oeste do estado de São Paulo. Praticamente toda a vegetação de tal região foi removida, para plantios de cana, eucalipto, laranja etc. A redução dessa vegetação também tem influência. A redução das matas ciliares dos rios que abastecem as represas é outro fator, pois provoca o assoreamento e um secamento mais rápido.

Correio da Cidadania: O que pensa dos primeiros protestos que começam a ser organizados, ou que ocorrem até espontaneamente, em torno à água, a exemplo do que tem ocorrido em cidades como Itu? Acredita que possam crescer a ponto de se tornarem massivos, e até mesmo reproduzirem as chamadas “guerras da água” que ocorreram em vários países?

Marzeni Pereira: Itu é um caso bastante emblemático. Lá, a gestão da água é de uma empresa privada, que vendeu água até acabar. E há o risco de a empresa abandonar a cidade quando a água acabar de vez e começar o prejuízo. Afinal, ela está lá atrás de lucro, não para fazer serviço filantrópico. Esse é o grande risco de o setor privado atuar no saneamento. Temos de combatê-lo.

Quanto aos protestos, são iniciativas interessantes da população. Ela tem de fazer parte da vida política do país, não pode ficar omissa em casa. É importante ter pauta de reivindicações, um programa a ser apresentado no momento. As manifestações ainda estão tímidas, mas acredito que a tendência é de ganharem força.

Mesmo porque a previsão para 2015 é de faltar mais água. Se não chover muito nesse verão, a coisa será pior. Portanto, há tendência de aumento de protestos no ano que vem. Como cidadão, já estou participando, como nos dias 1 e 5. São manifestações importantes e precisam continuar.

Correio da Cidadania: Nesse sentido, como acredita que será o ano de 2015 em São Paulo, especialmente no que toca a vida do cidadão médio? O racionamento, que de fato já ocorre, vai ser intensificado?

 

Marzeni Pereira: Na realidade, ainda não existe racionamento. O que é racionamento? É a definição de quanto cada pessoa, ou família, pode usar. Seria, por exemplo, definir uma cota de 150 litros por dia. Isso é racionamento. Existe outro modelo, o rodízio, que é quando se joga água de uma região para outra. Num dia, um local fica sem água e outro a recebe. Portanto, há diferença entre um e outro tipo de política.

Inclusive, penso que o racionamento tem de ser adotado, especialmente quando a situação se acirrar. Se não, alguns terão água e outros não, como acontece no rodízio. Quem tem caixa d’água ou um reservatório grande em casa não fica sem água. Quem não tem, fica sem. Imagine uma pessoa que sai de casa às 8 da manhã e volta às 10 da noite. Se não tiver caixa d’água, não toma banho. O rodízio é injusto pra quem não tem condição de comprar caixa d´água grande.

Em relação ao ano que vem, observamos que a recuperação do reservatório do Cantareira, nos últimos 10 anos, tem sido, em média, de 23%. Se, por exemplo, está em 10% em outubro, quando chegar a março deverá estar com 30% ou 40%. E essa marca não tem sido ultrapassada, com exceção de 2004 e 2008.

O problema é que neste ano estamos com 17% negativos. O volume operacional acabou em 15 maio; de lá pra cá, está sendo usado o volume morto. Se o reservatório recuperar 20% do volume, no final do período de chuvas não teremos mais de 5% de volume operacional. Se não tiver chuva em abril, quando normalmente ela é escassa, esses 5% durariam uns 30 dias, o que nos faria voltar a usar o volume morto em maio. Há um risco de usarmos o volume morto do Cantareira bem antes do período em que começamos a usar em 2014.

Correio da Cidadania: Finalmente, o que pensa que poderiam ser soluções tanto a curto, dada a gravidade da situação, como a médio e longo prazos?

Marzeni Pereira: A principal solução é chover. Se chover, tudo se resolve. Torcemos pra isso; de fato, caso contrário, a população vai sofrer. Se não chover, temos de tomar algumas medidas (na verdade, mesmo que chova, teremos que tomá-las).

Em primeiro lugar, é preciso reeducar a população a reduzir o consumo. As empresas também, pois quando se fala em redução de consumo parece que só a população consome. Mas, no Brasil, 70% da água é consumida pela agricultura, 22%, pela indústria e 8%, pelas residências. E quando se fala em redução de consumo, só se fala dos 8%, mas não dos 92%.

A região metropolitana de São Paulo não tem muito peso da agricultura, mas tem da indústria. Precisa reduzir o consumo residencial e industrial. Precisa também de uma forte redução de perdas. Precisa de uma orientação sem meio termo para a população. Não pode ser como hoje, o governo e a Sabesp têm de falar mais claramente à população de como a situação é grave, além de esclarecer se precisamos fazer rodízio, racionamento ou as duas coisas juntas.

Há a necessidade de definir as atividades humanas básicas que terão suprimento de água garantido, como hospitais, escolas, creches. Quanto à população de baixa renda, com menos condição de comprar caixa d’água, seria necessário o governo distribuir tais caixas, distribuir filtros de hipoclorito, porque muita gente vai usar água de mina se precisar, o que traz risco de contaminação. Em caso de falta de água generalizada e uso de carros-pipa, tem que se saber como aqueles que não têm caixa poderão armazená-la.

Outro ponto é em relação ao emprego. Se de fato se concretizar a previsão, ou seja, se ocorrer falta de água generalizada em 2015, muitas empresas vão fechar, ao menos temporariamente, ou se mudar. Se não tiver política de estabilidade no emprego, pode ser uma catástrofe.

Também se deve incentivar uso de água de chuva e reuso. Pouco se fala em coletar água de chuva. Se a população fizesse isso, e reduzisse ao menos 10% do consumo, teríamos cerca de 5 metros cúbicos por segundo de economia de água. Isso equivale ao novo sistema que a Sabesp constrói agora, o São Lourenço, que custará 2 bilhões de reais.

Finalmente, é necessário estatizar o saneamento – não a Sabesp, mas o próprio saneamento. Não tem sentido um serviço tão importante quanto esse na mão de quem quer lucro. Mas a estatização não pode ficar na mão do governo, com empresários controlando por dentro. É preciso controle dos trabalhadores. Além de uma comissão e investigação populares, que apurem responsabilidades. É preciso coletar e tratar mais esgoto, usando tal água em atividades, principalmente, industriais, pois há uma série de usos possíveis com a água de esgoto.

Recuperar mananciais é outro ponto importante. Se isso não for feito, as consequências futuras podem ser mais graves. O Rodoanel passou pelos mananciais, o que mostra como não se deu importância a eles. Pessoas que moram em áreas de mananciais precisam sair de lá, através de negociações sérias, com plano habitacional. Com casa garantida, claro, ao invés de serem retiradas como lixo.

Há uma série de ações possíveis no médio e curto prazo. Mas têm de ser feitas em diálogos com a população, se não os interesses pelo lucro vão falar mais alto.

sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Boulos pede coerência a Dilma e sugere Lobão na Cultura e Fábio Barbosa nas Comunicações

Portal Forum

Guilherme BoulosEm artigo publicado nesta quinta-feira (27), membro do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) critica, em tom irônico, as recentes escolhas da presidenta Dilma Rousseff na formação de sua equipe ministerial

Por Redação

Nesta quinta-feira (27), Guilherme Boulos, professor e membro do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), publicou um artigo na Folha de S. Paulo em que critica, em tom irônico, as recentes escolhas da presidenta Dilma Rousseff na formação de sua equipe ministerial. “Joaquim Levy na Fazenda foi uma sacada de gênio, com grande sensibilidade social. Pena que o Trabuco não quis, mas confio que seu subordinado no Bradesco dará conta do recado”, afirmou.

As referências são feitas também a Kátia Abreu, cotada para ser a próxima ministra da Agricultura. “Kátia Abreu na Agricultura achei um pouco ousado demais. Cuidado pra não ser chamada de bolivariana! Os índios e os sem- ­terra estão em festa pelo país. Não temos dúvidas de que o ministério terá um compromisso profundo com a demarcação das terras indígenas, o combate ao latifúndio e com a Reforma Agrária”, escreveu no texto destinado à presidenta.

Boulos disse ainda que a opção por Armando Monteiro para o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) deixaria os detratores de Dilma “sem argumentos”. “Dizem que a senhora não dialoga com a sociedade civil. Ora, como não? A Confederação Nacional da Agricultura em um ministério e a Confederação Nacional da Indústria em outro. Aí está a gema da sociedade civil, as entidades patronais”, ironizou.

No artigo, ele faz algumas indicações de pessoas que seguiriam a mesma linha dos ministros escolhidos até então. Boulos sugere nomes como o do ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab (PSD) para o Ministério das Cidades, o deputado federal Jair Bolsonaro (PP/RJ) para a Secretaria de Direitos Humanos, Fábio Barbosa, da revista Veja, para o Ministério das Comunicações, e o cantor Lobão assumiria como ministro da Cultura, após a demissão da petista Marta Suplicy.

Foto de capa: Reprodução/YouTube

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

O mal-estar com o Brasil

Postado: Carta Maior

por: Saul Leblon

O mal estar progressista acumula as dores do parto de uma nação várias vezes abortada na história. E mais uma vez agora na UTI, esmagada pelo cerco conservador.

coxinhas

Não se confunda esse sentimento com a histeria de uma elite incomodada com a ascensão dos pobres no mercado e na cidadania. Esta se resolve  em um resort em Miami.
O mal estar progressista acumula as dores do parto de uma nação inúmeras vezes abortada na história. E mais uma vez agora na UTI, esmagada pelo cerco conservador, respirando por aparelhos.
A construção  inconclusa de que falava Celso Furtado  enfrenta um de seus  capítulos mais angustiante nas horas que correm.
A prostração é a pior sequela.
Mãos que deveriam se unir em caminhada resoluta ruminam a solidão da espera e da dúvida, apartadas entre si e da esperança.
O conservadorismo atordoa o discernimento da sociedade com uma articulação vertiginosa de iniciativas.
Habilidosamente elas misturam o bem-vindo combate à ingerência do dinheiro organizado na vida democrática, ao lado da explícita  tentativa de se demonizar o polo progressista com o selo da política corrompida.
O desfecho cobiçado é impeachment de Dilma ou o sangramento irreversível de seu governo, e das forças que o apoiam, até o sepultamento histórico em 2018.
O que se pergunta ansiosamente é se  Lula já conversou sobre isso com Boulos, do MTST; se Boulos já conversou com Luciana Genro; se Luciana Genro já conversou com a CUT ; se a CUT já conversou com Stédile; se todos  já se deram conta de que passa da hora de uma conversa limada de sectarismos e protelações, mas encharcada das providencias que a urgência revela quando se pensa grande.
Se ainda não se aperceberam da contagem regressiva que ameaça o nascimento de um Brasil emancipado e progressista poderão ser avisados de forma desastrosa quando o tique taque se esgotar.
O mal estar progressista reflete outras perguntas que parecem desconectadas desta maior, mas que estão umbilicalmente associadas à falha na construção de uma hegemonia de esquerda que catalisasse as energias e as esperanças da sociedade em direção a um futuro compartilhado.
‘Quero saber quais as matérias de humanísticas existem no curso de medicina’, argui, por exemplo,  a promotora de Direitos Humanos e Inclusão Social do Ministério Público de SP,  Paula de Figueiredo Silva.
A promotora está estarrecida com relatos feitos por alunas da USP, vítimas de abusos sexuais.
Ela conduz um inquérito civil para   apurar denúncias de três  estupros em festas dentro de uma das  escolas  de medicina mais conceituadas do  país,  ademais de registro de preconceito racial e agressão a um casal homoafetivo que tentou participar de um dos eventos promovidos pelos estudantes nos últimos anos.
O que parece um mal-estar específico da promotora Paula de Figueiredo remete a um sentimento mais amplo quando emoldurado por episódios recentes envolvendo médicos, estudantes de medicina e entidades representativas do setor.
A 10 dias do segundo turno das eleições deste ano, e após um debate no SBT, a presidenta  Dilma teve uma queda de pressão e  interrompeu uma entrevista ao vivo.
O gaúcho Milton Pires disparou em sua página no Facebook o seguinte comentário:
"Tá se sentindo mal? A pressão baixou? Chama um médico cubano, sua grande filha da puta!”.
Pires é médico. Especialista em terapia intensiva.
No dia seguinte, a Associação Médica Brasileira (AMB) manifestou-se; não para se solidarizar com  Dilma, e sim para conclamar a classe médica a eleger Aécio Neves.
Dez dias antes, após a vitória petista no primeiro turno (5/10), o site ‘Dignidade Médica ‘, frequentado por um grupo de quase 100 mil  internautas que se identificam como médicos ou estudantes de medicina, postou dezenas de críticas à escolha das urnas.
Em uma dela, uma médica defendia 'castrações químicas'.
Outra, um ‘holocausto’.
Contra nordestinos que votaram em Dilma.
Pouco mais de um ano antes, em agosto de 2013, o médico cubano Juan Delgado, um negro a de 40 anos, foi submetido a  um coral de natureza ética equivalente  ao desembarcar  no Brasil.
Ao lado de outros profissionais de Cuba, Delgado   chegara para trabalhar no programa Mais Médicos.
Um corredor polonês   formado  por médicos e estudantes brasileiros de medicina, assediou o recém-chegado de forma agressiva no saguão do aeroporto de Fortaleza.
‘Escravo, escravo, escravo!’, reverberava em uníssono o funil de peles alvas e jalecos brancos.
A hospitalidade correu o mundo.
O mal-estar progressista pressentiu algo letal nas vísceras da nação, mas talvez tenha subestimado a extensão da ameaça ao nascimento de um Brasil mais próspero e justo.
Era mais que isso, mas o episódio foi interpretado como a rejeição corporativa  a um programa emergencial criado para mitigar a carência de atendimento em  municípios e periferias, onde profissionais brasileiros não querem trabalhar.
Por exemplo, nas aldeias indígenas das etnias Ka’apoo e Awá, no Maranhão.
Endereço: município de Zé Doca,  300 quilômetros de São Luís,  acessível por estrada de terra.
É lá que o doutor Juan Delgado vive e atende hoje.
Outros 14. 400 profissionais do programa fazem o mesmo  em 3.785 municípios, adicionando mais 50 milhões de brasileiros pobres à cobertura do SUS.
A receptividade a esse mutirão foi  avaliada recentemente.
Pesquisa divulgada no final de outubro, realizada pela Universidade Federal de Minas Gerais   ouviu 4 mil usuários do  Mais Médicos em 200 cidades do país.
Cerca de 95% dos entrevistados declararam-se muito satisfeitos ou satisfeitos com uma iniciativa condenada por amplos segmentos da classe médica brasileira.
Notas  de 8 a 10 foram dadas ao programa por 87% dos entrevistados.
Mas, sobretudo, os usuários elogiaram o comportamento mais atencioso dos médicos.
Mais interessados em ouvir e habituados a dialogar revelaram-se mais competentes em diagnosticar e tratar.
Médicos cubanos representam 80% do alvo desse elogio.
Por quê?  Porque apenas 1.846 brasileiros se inscreveram no programa.
Se dependesse da adesão local, 45 milhões de cidadãos continuariam apartados da assistência no país.
O mal estar progressista subestimou a clivagem embutida nessa matemática.
Não se trata de demonizar a classe médica brasileira.
Uma sociedade não é feita de anjos e demônios, mas de seres de carne, osso e circunstâncias.
São as circunstâncias que levam a estabelecer conexões entre a subestimação progressista com o que se passa na sociedade e as frequentes demonstrações de que algo dissociado da sorte do país e do destino de sua gente predomina em segmentos referenciais.
O médico e os estudantes de medicina são apenas a ilustração desse fenômeno.
O exemplo do cardiologista Adib Jatene, falecido na semana passada, é a resposta para quem enxerga nesse sentimento a expressão de um ponto de vista marcado pelo reducionismo partidário.
Jatene era um conservador.
Serviu aos governos Maluf, Collor e Fernando Henrique Cardoso.
Mas tinha um compromisso tão elevado com a medicina  que se tornou referência suprapartidária no debate das políticas públicas na área.
Ele foi o responsável pela criação da CPMF  durante o governo do PSDB.
Tornou-se um dos mais ardorosos defensores da sua   recriação quando o ‘imposto do cheque’ foi extinto pela coalizão demotucana, em dezembro de 2006.
Cerca de R$ 40 bilhões por ano foram subtraídos assim do atendimento à fila do SUS.
Um ano depois, de dedo em riste, a voz alterada, ele ainda  interpelava  Paulo Skaf, então presidente da Fiesp,  um dos animadores da campanha que uniu PSDB, Demos e outros contra a CPMF:
‘No dia em que a riqueza e a herança forem taxadas, nós concordamos com o fim da CPMF. Enquanto vocês não toparem, não concordamos. Os ricos não pagam imposto e por isso o Brasil é tão desigual. Têm que pagar! Os ricos têm que pagar para distribuir renda. A CPMF não dá para sonegar! (por isso vocês são contra)". (Folha; Monica Bergamo; 13/11/2007).
A ira santa de Jatene em defesa da saúde pública contrasta com a rigidez  dos que combateram e combatem arduamente políticas como o Mais Médicos, o Bolsa Família, o ganho no poder de compra do salário mínimo, entre outras.
As diferenças não são técnicas, mas tampouco apenas partidárias, como fica claro.
São mais profundas e espraiadas.
A menos de um mês de uma vitória histórica nas urnas, tudo se passa como se o 26 de outubro fosse um ponto de referência longínquo em um calendário desbotado .
O mal estar progressista, distinto daquele que espairece no portão de embarque para Miami,   só tem cura se associado a uma mudança profunda nas instituições que esclerosaram enquanto se avançava em conquistas sociais e econômicas. E agora ameaçam reverte-las ferozmente.
Para colher frutos duradouros da faxina na corrupção, o passo seguinte não poderá se restringir a mudanças   nas regras de financiamento de campanha.
Elas são necessárias, mas insuficientes para combater o mal-estar que aqui se discute.
Dilma poderá colocar quem ela quiser na Fazenda e no Banco Central.
Mas se não cuidar de certas tarefas santas, dificilmente reverterá um estado de espírito que ameaça reduzir o seu segundo governo a um melancólico intermezzo da restauração neoliberal, com requintes de regressão política e social intuídos nos dias que correm.
O que se passou na Itália após o ‘Mãos Limpas’, nos anos 90, não é uma miragem; é uma possibilidade real em uma sociedade desprovida de representação política forte e organização social mobilzada (leia ‘Mãos Limpas; e depois, Berlusconi?’; nesta pág).
Lá como aqui o lubrificante do retrocesso histórico foi a prostração progressista;  a incapacidade de se reaglutinar a esquerda e os democratas em torno de um repto histórico de esperança para a sociedade.
Regular a mídia; eliminar a hegemonia do dinheiro organizado na política; abrir canais de diálogo consequentes e permanentes com os movimentos sociais; salvar o pré- sal e a Petrobras; atrair a juventude pobre e a da classe média para a tarefa de reformar a escola e a universidade, com o olho na formação do discernimento crítico do país e não apenas no mercado.
Se fizer isso, Dilma não levará a sociedade brasileira ao paraíso.
Mas terá dado os passos necessárias para afastar a película de mal-estar e rendição que hoje ameaça matar de inanição a esperança em um Brasil melhor.
Por onde começar?
Respondendo à pergunta ansiosamente repetida no ambiente progressista.
O que se quer saber é se Lula já conversou com Boulos, do MTST; se Boulos já conversou com Luciana Genro; se Luciana Genro já conversou com a CUT ; se a CUT já conversou com Stédile; se todos  já se deram conta de que passa da hora de uma conversa limada de sectarismos e protelações, mas encharcada das providencias que a urgência revela quando se pensa grande.
Se ainda não se aperceberam da contagem regressiva que , mais uma vez, ameaça abortar o nascimento de um Brasil emancipado e progressista, bem...
Serão avisados de forma desastrosa quando o alarme soar.