Enquanto a aprovação do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff monopoliza
atenções, uma série de acontecimentos negativos no campo se destacou nos
noticiários. O mais trágico, o assassinato de dois sem terras em Quedas do
Iguaçu (PR), na mesma semana em que o movimento social voltou a divulgar o
acirramento dos índices de violência no campo, por conta da terra, mas
cada vez mais pela água também. Para falar do assunto e relacioná-lo aos
acontecimentos na cidade e nos poderes, conversamos com Gilmar Mauro,
importante liderança do MST, o Movimento dos Trabalhadores Sem
Terra.
O entrevistado vê os assassinatos no Paraná como uma provocação de
consequências extremas do velho conluio público-privado que dá as cartas
no Brasil, especificamente no estado do Paraná e em sua atual gestão. “Já
existe tensão na região há bastante tempo. A empresa (Araupel) possui
grupos de segurança armada e ainda tem contratado os serviços de
pistoleiros – para além das formalidades em relação à segurança. Mas o
mais grave é que o grupo sustentou várias campanhas de deputados, entre
elas, a do chefe da casa civil paranaense Valdir Rossoni (PSDB), eleito
com dinheiro da Araupel”, declarou Gilmar Mauro.
Contrário ao impeachment, Gilmar Mauro acredita que, se houvesse
mais tempo para mobilizações, seria possível barrar o prosseguimento do
processo de impedimento ainda na Câmara dos Deputados. Para ele, houve um
complô de forças conservadoras contra a presidente Dilma Rousseff, com
vistas ao relaxamento das investigações de crimes de corrupção que
poderiam cair sobre muitos votantes. Ainda afirmou que o último domingo
foi “pedagógico” para a população brasileira, que agora tem uma ideia mais
clara do que é o seu Congresso Nacional, o que favorecerá um processo de
politização.
“Para termos uma ideia, a própria deputada de Montes Claros (Raquel
Muniz, PSD-MG), que homenageou o marido dizendo que ele era um exemplo
para a nação, viu o mesmo marido preso no dia seguinte por corrupção, em
clara demonstração de que o Congresso Nacional é hoje um bando de ratos; e
por isso esse impedimento não tem legalidade. Qualquer governo que venha
assumir, seja Temer ou Cunha, não vai ter moral e nem legalidade. Por
isso, é evidente que nós vamos aproveitar desse momento pedagógico para
politizar a população brasileira acerca daquilo que são as instituições –
agora reveladas pelo último domingo no Congresso Nacional”.
A íntegra da entrevista com Gilmar Mauro pode ser lida a
seguir.
Correio da Cidadania: O que você comenta sobre os assassinatos de
dois trabalhadores sem terra recentemente no Paraná?
Gilmar
Mauro: O que
ocorreu no Paraná foi uma provocação. Uma provocação muito grave que trata
da eliminação de vidas. O grupo Araupel, que controla uma quantidade
enorme de áreas no Paraná, recebe verbas públicas há muito tempo e já se
utilizou de todos os recursos naturais dessas áreas. Mais além de ter
destruído todos os recursos naturais das terras, ainda plantou
monoculturas de eucalipto, que são florestas homogêneas, para fins de
investimentos econômicos.
Já existe tensão na região há bastante tempo. A empresa possui
grupos de segurança armada e ainda tem contratado os serviços de
pistoleiros – para além das formalidades em relação à segurança. Mas o
mais grave é que o grupo sustentou várias campanhas de deputados, entre
elas a do chefe da Casa Civil Valdir Rossoni (PSDB), eleito com dinheiro
da Araupel. E ainda sustenta vários outros políticos na região.
Forma-se um complô entre a empresa, parte do Ministério Público,
parte da Polícia Militar e também agora a Casa Civil e a Secretaria de
Segurança do Paraná. Vendo a possibilidade de perda da área na justiça,
por tratar-se de terra pública da União, o grupo Araupel tentou criar uma
situação de conflito. Para isso se utilizou inclusive dos serviços da
Polícia Militar do Paraná, que provocou o acampamento.
A ideia deles era de que nosso povo reagisse e proporcionasse as
condições para uma intervenção militar maior. Felizmente, conseguimos
fazer uma grande mobilização de massas, demos uma resposta de massas e a
nossa base não caiu na provocação.
É evidente o vínculo desse episódio no Paraná com a conjuntura
política nacional. Há setores de direita que estão tentando provocar de
todas as formas conflitos sociais, apregoando o caos para justificarem
ações do tipo militares, não só no Paraná. O episódio ocorre precisamente
no mês em que se cumprem 20 anos do massacre de Eldorado dos Carajás,
cujos assassinos e mandantes continuam soltos. É lamentável e muito
preocupante a situação no Paraná e no restante do Brasil.
Correio da Cidadania: Em abril de 2015 o MST fez cerca de 50
ocupações de terras. Como andaram as ações do movimento neste ano que
passou?
Gilmar
Mauro: Há uma
tendência. É o que eu falei no ano passado e acabou se revelando com o
agravamento da crise, o aumento do desemprego e uma piora geral na vida da
população. Um momento de grande procura de famílias sem terras a fim de
compor os acampamentos. Nesse ano já ocorreram muitas ocupações e a
tendência é que no segundo semestre muitas mais ocorram.
Além do viés socioeconômico e da crise brasileira, há um outro
ingrediente, que estamos construindo num debate com a sociedade, sobre o
tema dos agrotóxicos, da utilização da terra, da água, dos recursos
naturais. Tenho percebido uma preocupação bastante grande da sociedade em
relação ao consumo de alimentos.
Historicamente, temos um ponto de vista que coloca o campo como
lugar do atraso. Até na poesia, na literatura e nas artes há a ideia dos
“Jecas Tatus”, o que criou na população do campo uma espécie de autoestima
baixa, que fazia com que todo pai de família dissesse aos filhos para
estudarem e irem para a cidade, “porque aqui é difícil”. E de fato os
próprios produtos agrícolas são utilizados de forma pejorativa na
sociedade. Quando alguém tem um problema fala de “abacaxi”, “pepino”,
“fumo” ou “pisar em tomates”. Essa situação tem se revertido porque o
campo tem se transformado em uma esperança. Um lugar de produção de
alimentos saudáveis e ar puro exatamente no momento em que a cidade está
se transformando no lugar do stress, das dificuldades, da falta de moradia
e assim por diante.
Além do ingrediente socioeconômico, ainda há um outro, de busca de
qualidade de vida. Assim, é possível prever que muitas ocupações de terra
ainda ocorram em nosso país. Esperamos que depois de vencida a batalha do
golpe, de fato o governo possa dar prioridade à reforma agrária, com
investimentos na arrecadação de terra para o desenvolvimento da
agricultura. Todos nós sabemos que em um momento de crise, se as famílias
tiverem um lugar para plantar, colher e morar, evidentemente a situação
pode ser não apenas amenizada, mas gerar propostas de produção e
abastecimento multiplicadoras no comércio, nos serviços, e promover algum
desenvolvimento econômico. Não tenho nenhuma dúvida de que a luta pela
reforma agrária e pela terra vai continuar e vão ocorrer muitas ocupações
de terra nesse ano no nosso país.
Correio da Cidadania: Como avalia o último domingo na Câmara dos
Deputados e o que esperar do atual momento marcado pelo processo de
impedimento da presidenta Dilma?
Gilmar
Mauro: A avaliação
que fazemos é que houve muito mais manifestações contra o impeachment do
que a favor. Uma demonstração de que, se tivéssemos talvez mais uma semana
antes da votação, poderíamos conseguir fazer com que a população fosse
mudando a opinião de alguns parlamentares. Há uma participação cada vez
maior com o envolvimento da intelectualidade, dos artistas e também da
população que está se dando conta de que aquilo foi armado. E essa armação
se comprovou no Congresso Nacional.
No domingo, em particular, tivemos uma aula de cretinismo político.
De fato, Lenin já falava que “o parlamento é uma fábrica de cretinos” e
domingo passado essa teoria se comprovou para todo o Brasil. De qualquer
forma, acho que foi pedagógico. Porque o povo brasileiro viu de fato quem
são os parlamentares da Câmara Federal e do Congresso Nacional. Foi
vergonhoso. A maioria dos votos foi em nome da família, de Deus, de
filhos, netos etc. No fundo se comprova aquilo que já havíamos denunciado,
um complô.
Foi pedagógico para a população brasileira se dar conta de quem são
os parlamentares e quem é o Congresso Nacional. Como brasileiro eu me
sinto envergonhado de ter um parlamento desse tipo. Aliás, tornaram-se
piada nacional e internacional as formas e conteúdos apresentados para
impedir a presidenta da República. Isso só revela que as bancadas do boi,
da bola, da bala, da bíblia e os grandes corruptos se articularam em uma
perspectiva de se auto salvarem de um processo de investigação.
Para termos uma ideia, a própria deputada de Montes Claros (Raquel
Muniz, PSD-MG), que homenageou o marido dizendo que ele era um exemplo
para a nação, viu o mesmo marido preso no dia seguinte por corrupção, em
clara demonstração de que o Congresso Nacional é hoje um bando de ratos; e
por isso esse impedimento não tem legalidade. Qualquer governo que venha
assumir, seja Temer ou Cunha, não vai ter moral e nem legalidade. Por
isso, é evidente que nós vamos aproveitar desse momento pedagógico para
politizar a população brasileira acerca daquilo que são as instituições –
agora reveladas pelo último domingo no Congresso Nacional.
Há uma crise política que no decorrer de todo esse debate revela o
que são as demais instituições como o Ministério Público, o Poder
Judiciário e outras. Temos um monte de promotores públicos e juízes
mequetrefes, com muito ódio e pouco conteúdo de fato. E isso vai se
traduzir em um processo de formação política do povo brasileiro. Estou com
uma expectativa muito grande de que nós possamos avançar enormemente no
próximo período.
Correio da Cidadania: Como analisa este último ano de governo Dilma
e os recentes decretos de desapropriação de terras para reforma agrária em
meio ao ápice da crise de seu governo?
Gilmar
Mauro: O governo
Dilma, em suas ações no que se refere à reforma agrária, foi pífio para
não dizer inexistente. Foi praticamente nulo. Nesse segundo mandato não
foi feito quase nada. Exceto neste ano, em que algumas áreas foram
arrecadadas, no ano passado não houve nenhuma desapropriação.
Do ponto de vista da nossa base, as principais questões não foram
atendidas. Vários projetos que foram aprovados no Congresso Nacional, e
alguns deles até por iniciativa do Executivo, como o tema da
criminalização dos movimentos sociais, são extremamente complicados e
graves. Entretanto, a nossa posição muito acertada e firme contra o golpe
não é uma defesa burra do governo, mas uma defesa das conquistas
democráticas do nosso povo brasileiro, que estão em disputa faz muito
tempo.
Como eu disse, não fazemos uma defesa cega do governo, mas das
conquistas democráticas que nosso povo atingiu. E principalmente contra a
onda fascista que se espalha pelo mundo. Portanto, creio que seja uma
tarefa não só do MST, mas de todos e todas, não apenas de esquerda, como
também dos que defendem a liberdade e a ampliação da
democracia.
Correio da Cidadania: Independente do desfecho que venha a ter o
processo de impeachment, como prevê a continuidade da vida política
brasileira, especialmente no que se refere à pauta do
MST?
Gilmar
Mauro: Penso que
temos de nos preparar para um longo período. Se tem uma coisa que eu acho
e tenho dito internamente no MST é que temos uma luta prolongada. Serão 10
anos ou mais. A sociedade brasileira está dividida. Não é uma cisão estilo
disputa de futebol, mas característica da luta de classes. Há
ingredientes, e sempre busco usar metáforas, de que estamos vivendo um
período de tempestades. E as tempestades são eventos presentes na natureza
que podem trazer tanto tragédias quanto felicidades; elas têm o seu
aspecto positivo. Numa tempestade, várias árvores que estão tomadas por
cupins, vários galhos podres e edificações mal construídas vão perecer.
Entretanto, utilizando um velho proverbio chinês, “quem tem raízes não
teme as tempestades”. Eu diria que também é um momento para aqueles e
aquelas que têm raízes profundas no Brasil se consolidarem e se
fortalecerem para fazer os enfrentamentos de luta de classes que serão
muito presentes no próximo período.
Durante os governos petistas, houve um processo, não sei se posso
dizer de despolitização, mas pelo menos de não politização da sociedade
brasileira. E nos últimos 30, 40 dias, a politização se intensificou de
uma forma muito forte. Tal processo de politização se dá hoje em vários
campos da sociedade. Na sociedade civil de forma geral, mas também no
núcleo familiar, pelas redes sociais. Em grupos de familiares que não
discutiam política e agora estão discutindo. E de uma forma muito
acelerada. Porque a sociedade se organiza e se aglutina em torno de polos.
E dois grandes polos hoje estão caracterizados no Brasil: um polo dos
democratas, e aí está também a esquerda, e um polo da direita fascista,
que quer o retrocesso da sociedade brasileira. Isso tende a ser a marca da
sociedade no próximo período.
Temos que não só nos preparar para derrotar esse polo fascista no
Congresso, mas principalmente na rua, onde será a derrota deles.
Precisamos nos preparar também para promover nos próximos dez anos um
intenso processo de politização. É o ingrediente positivo: pudemos avançar
muito na politização e nas formas organizativas da classe trabalhadora.
Porque a classe em si é uma coisa muito ampla, mas, de forma geral, os
mais diversos setores das classes trabalhadoras estão politizados e
organizados de alguma forma. Assim, acredito que vamos avançar a passos
largos na perspectiva de consolidar a consciência de classes no nosso
país, algo importante para superar essa ordem extremamente perversa do
capitalismo no Brasil.
Correio da Cidadania: As políticas de ajuste fiscal, implementadas
pelo governo Dilma desde o ano passado, têm trazido uma séria de
retrocessos aos direitos dos trabalhadores. De que forma isso se traduz no
campo?
Gilmar
Mauro: Não é
diferente, hoje a distância é muito pequena entre o campo e a cidade.
Estamos sob a égide e lógica do capital, portanto as mesmas empresas que
atuam na cidade e no sistema financeiro atuam também no meio rural. Assim,
os impactos das políticas recessivas e neoliberais atingem de igual forma
o campo e a cidade. Evidentemente, o campo talvez tenha algumas condições
que permitam uma maior resistência.
Na cidade, a possibilidade de o desemprego estar sempre às portas
das casas das famílias é um problema, pois quando se está desempregado
perdem-se perspectivas até mesmo de sobrevivência. O campo, para aqueles
que sejam pequenos agricultores, inclusive dos assentamentos da reforma
agrária, dá condições de produzir a própria alimentação. Evidentemente, há
setores no campo, como os assalariados rurais, que sofrem uma série de
impactos na medida em que o desemprego avança. Por isso muitas famílias
estão procurando os acampamentos dos sem terra. Tanto pela sobrevivência
quanto numa perspectiva de conquista do seu pedaço de terra e ter um
espaço para a produção da sua própria comida.
Eu acho que essa situação tende a se agravar porque a crise
econômica não é uma particularidade brasileira. No mundo inteiro a crise
cada vez se agrava mais. E as saídas apresentadas pelo capitalismo são
saídas que agravaram ainda mais a crise econômica. A reunião do G8 não
apresentou nenhuma proposta concreta para a humanidade. Muito pelo
contrário, a única alternativa que ficou mais ou menos patente seria fazer
a quarta revolução tecnológica e industrial, que implicaria na demissão de
70 milhões de trabalhadores em todo o mundo. As medidas apresentadas pelo
capitalismo são medidas que contam com um processo de maiores problemas
sociais.
Verificamos agora no Oriente Médio e na Europa, com o desemprego e
a violência, um agravamento de problemas gravíssimos que beiram a
barbárie. Portanto, um outro desafio, do nosso caso particular aqui no
Brasil, é resistir ao golpe e se preparar para politizar. O desafio de
todos os movimentos de esquerda e progressistas é buscar articulações
internacionais com o objetivo de fazer um enfrentamento mundial imediato
contra a ordem do capital.
Correio da Cidadania: Mesmo com o que você chamou de “ação não
politizadora” dos tempos de lulismo, acredita que ainda é possível compor
uma alternativa de esquerda para o país junto aos setores fiéis a
Lula?
Gilmar
Mauro: Acho
possível, sim. E a decisão política nossa de estar junto diz que quem está
junto tem direito a criticar. É simples estar junto não de forma cega, mas
de uma forma crítica.
Evidentemente, é preciso fazer autocríticas. Talvez nem todo mundo
vá conseguir compreender. Mas uma grande parte da militância petista hoje
está compreendendo muito claramente essa autocrítica. Mais que
compreendendo, está assimilando com uma perspectiva de mudança, algo que
vai se espalhando muito mais rapidamente.
A Frente Brasil Popular está se organizando em vários municípios do
Brasil. E acredito que também a Frente Povo Sem Medo tenha ampliado
bastante o seu raio de ação. A Frente Brasil Popular, com a qual tenho uma
maior ligação, está em municípios pequenos, dentro de universidades,
escolas, bairros e assim por diante. Assim como comitês contra o golpe com
a inserção de artistas, intelectuais e setores de classe média muito
importantes.
Evidentemente, teremos muitas contradições pela frente. Vêm as
eleições municipais agora, depois as presidenciais em 2018. Como eu disse
anteriormente, construir boas raízes nas formas organizativas, ainda que
não sejam definitivas, mas com embriões de novas formas, alianças e
articulações para a construção de frentes ainda mais amplas, é fundamental
para organizar grande parte da classe trabalhadora em todo o território
nacional.
Eu espero que essas formas de organização venham para politizar a
classe trabalhadora no limite da radicalização da democracia. Agora, a
classe ainda tenta construir um programa mínimo, que aponte não só para
resistir ao retrocesso, mas em uma perspectiva de democratização dos meios
de comunicação, do poder judiciário, de reforma política no nosso país e
de ampliação de debates sobre a reforma agrária, a reforma urbana, a
produção de empregos e assim por diante.
Esse é um programa mínimo e o processo está bastante acelerado. Eu
diria ser um momento de estarmos juntos para termos o direito à palavra.
Passado o momento de maior tensão, continuar a construção para tentarmos
produzir uma unidade, ainda que cheia de contradições, em uma perspectiva
de avanço. Por isso acho que os setores de esquerda mais radicalizados que
não participaram desse processo devem refletir e se somar aos processos de
mobilização de rua, que são muito importantes e muito
politizadores.
Correio da Cidadania: Quais projeções podemos fazer para o futuro
do país em meio a toda essa crise política, econômica, social e ética? E
qual será o papel do MST?
Gilmar
Mauro: O MST é mais
uma organização dentro desse contexto. Nunca tivemos a ambição de dominar
ou hegemonizar a esquerda, muito menos de sermos uma vanguarda do
processo. Estamos dentro da nossa construção orgânica, felizmente muito
estruturada como organização. Mantivemos sempre as nossas escolas de
formação militante e continuaremos inclusive ampliando-as para outros
setores da sociedade brasileira.
A esquerda de alguma forma superestimou a capacidade intelectual da
elite brasileira. Acho que isso está sendo demonstrado claramente no
processo do impeachment e tentativas de golpe. Fica patente quão limitada
é. Por tal razão é importante a preocupação da militância de que o ódio
colocado contra o movimento social em geral – e não é só com o PT, mas com
toda a esquerda de forma mais geral – falta em conteúdo, mas sobra em
disposição destrutiva.
Evidentemente, não se trata de subestimar as elites brasileiras,
não estou falando disso. Acho que não devemos nem subestimar e nem
superestimar. O grande desafio é, partindo deste programa mínimo e das
condições apresentadas, tentar avançar na perspectiva de criar espaços
maiores de participação popular. No meu modo de ver, se pudéssemos
resgatar o velho criador deste jornal, o nosso camarada Plínio, ao
discutir o tema de participação popular, numa perspectiva de espaços de
luta, de mobilização envolvendo a cultura e a juventude, poderíamos nos
ajudar a fazer uma autocrítica contundente, inclusive das formas de
mobilização. Para além do modo como se fazem mobilizações, sob a ideia do
caminhão de som lá em cima e todo mundo disputando um microfone, é
possível ter novas formas de participação, de agitação e propaganda, que
envolvam a juventude e outros setores da sociedade brasileira que não
estão contemplados nas nossas falas e formas usuais.
1) é possível construir novas formas organizativas;
2) é preciso estimular a participação popular;
3) essa participação tem de ser politizada para que se transforme
em políticas de um governo popular;
4) é preciso discutir estratégias e projeto político junto com a
militância e a classe trabalhadora, em uma perspectiva nesse momento de
radicalizar a democracia e discutir todo o conjunto de questões que
mencionamos ao longo da conversa;
5) montar no Brasil e em nível internacional um movimento da classe
trabalhadora e construir possibilidades reais, a fim de reunir força
concreta para alterarmos a ordem do sistema no Brasil e em escala
internacional.
Não é uma luta para 15 dias, nem pra 2018, e não é uma luta que se
encerra na nossa geração. É uma luta bastante prolongada, mas estou muito
otimista com as novas condições que estão sendo criadas. Acho que vamos
resistir ao fascismo e plantar sementes muito boas para o
futuro.
|