Translate - Tradutor

Visualizações de página

sexta-feira, 19 de junho de 2015

Fórmula 85/95: proposta do Congresso x governo

DIAP (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar) / Neuriberg Dias*

Postado: INTERSINDICAL CENTRAL DA CLASSE TRABALHADORA

Fórmula 85 95 AposentádoriaEm comparação à proposta aprovado pelo Congresso Nacional, a Medida Provisória fez três modificações que incluiu a regra da progressividade da fórmula 85/95, exclui a possiibilidade de quem não atingiu a regra poder trabalhar menos tempo para obter aposentaodria integral e, por fim, altetou a proposta dos parlamentares que prévia 70% dos maiores salários-de-contribuição para calculo da aposentadoria.

Após anuncio do veto da emenda 45, do deputado Arnaldo Faria de Sá PTB-SP), incluída na MP 664/14, o Poder Executivo, editou e foi publicado no Diário Oficial da União desta quinta-feira (18), a Medida Provisória 676/15 que altera a Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social, para estabelecer a fórmula progressiva da regra 85/95 para obtenção de aposentadoria integral sem aplicação do fator previdenciário.

Para entender melhor sobre assunto o DIAP fez um quadro comparativo em relação ao texto vetado:

1. Manteve o fator previdenciário e faculta ao trabalhador a opção por alternativa da fórmula 85/95 para obter aposentadoria integral. Quando a soma da idade e do tempo de contribuição atingir 85 (30 anos de contribuição + 55 de idade) ou maior a mulher terá direito a aposentadoria integral. O mesmo ocorrer para os homens quanto a idade e o tempo de contribuição atingir 95 ou maior (35 anos de contribuição e 60 de idade) receberá aposentadoria integral. Ou seja, agora somente vale uma ou outra;

2. Introduziu a regra progressiva da fórmula 85/95 sendo majorada em um ponto até 2022. Assim em 2017: 86/96; 2019: 87/97; 2020: 88/98; 2021: 89/99; 2 2022: 90/100. Segundo o governo essa proposta visa dar maior segurança e sustentabilidade para a previdência social;

3. Retirou a proposta do Congresso que dava possiblidade de redução do tempo para obtenção de aposentadoria integral caso o trabalhador não tenha atingido a fórmula 85/95. Anteriormente o trabalhador poderia trabalhar um período bem menor e obter aposentadoria integral; e

4. Retirou a mudança do Congresso sobre a média aritmética aprovada pelo Congresso Nacional que previa maiores salários-de-contribuição correspondentes a 70% de todo o período contributivo, multiplicada pelo fator previdenciário. Agora, se mantem a regra atual, correspondendo os 80% do período contributivo; e

5. Manteve dispositivo que iguala os professores aos demais trabalhadores para obtenção da aposentadoria com base na regra 85/95.

Leia abaixo a íntegra da medida provisória editada pelo governo e que será votada no Congresso Naciona:

MEDIDA PROVISÓRIA 676, DE 17 DE JUNHO DE 2015

Altera a Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social. A PRESIDENTA DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 62 da Constituição, adota a seguinte Medida Provisória, com força de lei:

Art. 1o A Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, passa a vigorar com as seguintes alterações: “Art. 29-C. O segurado que preencher o requisito para a aposentadoria por tempo de contribuição poderá optar pela não incidência do fator previdenciário, no cálculo de sua aposentadoria, quando o total resultante da soma de sua idade e de seu tempo de contribuição, incluídas as frações, na data de requerimento da aposentadoria, for:

I – igual ou superior a noventa e cinco pontos, se homem, observando o tempo mínimo de contribuição de trinta e cinco anos; ou

II – igual ou superior a oitenta e cinco pontos, se mulher, observando o tempo mínimo de contribuição de trinta anos.

§ 1º As somas de idade e de tempo de contribuição previstas no caput serão majoradas em um ponto em:

I – 1º de janeiro de 2017;

II – 1º de janeiro de 2019;

III – 1º de janeiro de 2020;

IV – 1º de janeiro de 2021; e

V – 1º de janeiro de 2022.

§ 2º Para efeito de aplicação do disposto no caput e no § 1º, serão acrescidos cinco pontos à soma da idade com o tempo de contribuição do professor e da professora que comprovarem exclusivamente tempo de efetivo exercício de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio.”

(NR) Art. 2º Esta Medida Provisória entra em vigor na data de sua publicação.

(*) Jornalista e assessor legislativo do Diap

sábado, 13 de junho de 2015

Financiamento empresarial: mola mestra da corrupção sistêmica

Escrito por Léo Lince

Postado: Correio da Cidadania

120615_financiamentoO poder corrosivo do dinheiro na definição dos rumos da política é um problema tão antigo quanto a Sé de Braga. Não se trata, por suposto, de invenção recente. Além de antiga, essa é uma questão crucial para a sobrevivência da democracia política. Os grandes partidos da ordem dominante, que hoje chafurdam neste velho lamaçal, só merecem a execração pública porque pegaram o bonde andando e sentaram na janelinha.

José de Alencar, não o fabricante de camisetas e cachaça que foi vice do Lula, mas o autor de "O Guarani",  um dos grandes da nossa literatura romântica, tratou com absoluta propriedade do tema ainda nos primórdios do ordenamento da nossa representação política. Foi também parlamentar e escreveu coisas que até hoje conservam plena atualidade.  Exemplo: "o peso do dinheiro no resultado da representação é uma extorsão da soberania popular".  E mais: "quem  faz do voto uma mercadoria é o candidato (que compra) e não o eleitor (que vende), a corrupção é a arma do letrado e não do analfabeto".  Diagnósticos certeiros sobre problemas que se avolumaram ao longo do tempo.

As campanhas eleitorais no Brasil estão entre as mais caras do mundo. Cada eleição é mais cara do que a anterior. A trajetória do custo altíssimo, depois de passear por empreiteiros, banqueiros, "petequeiros" e tesoureiros, termina sempre no mesmo lugar: o erário público. Basta seguir o curso do dinheiro para saber quem paga a conta no final. O doador só é generoso porque mama o dobro do que deu nas tetas do Tesouro. Nenhum financiamento público exclusivo custaria mais caro.

Além de caras, as campanhas se organizam de sorte a tornar impossível a fiscalização. Há milhares de candidaturas individuais que arrecadam e gastam sem qualquer limite razoável. São os candidatos que definem o quanto vão gastar.  Um caos que ninguém controla. A Justiça Eleitoral só acompanha, e mal fiscaliza, os gastos declarados do "caixa um". O "caixa um e meio", a chamada doação oculta que se avoluma a cada pleito, torna ainda mais opaco o processo e mais difícil a fiscalização. Do "caixa dois", então, nem se fala: só quando estoura escândalo dos grossos é que se vê o tamanho do prejuízo.

Os dados, precários, pois se limitam aos gastos declarados, sobre os financiadores de campanha revelam que no Brasil, mais do que em qualquer outro país do mundo, há um peso desmedido das fontes empresariais. A contribuição cidadã,  vinda de pessoas físicas, é diminuta, apenas residual. Mal comparando, pois as realidades são bem distintas: nos EUA, pleito de 1984, 10% dos eleitores registrados contribuíram. No Brasil, pleito 1994, menos de 0,1%. Em número de pessoas: 10 milhões contra 75 mil. Na realidade, um seleto grupo de grandes corporações empresariais domina o mercado de financiamento de campanha eleitoral e, a partir deste fato indiscutível, bloqueiam a transformação de maiorias sociais em maioria política.

O formato atual de financiamento perpetua o status quo, estreita os vínculos entre o conservadorismo político e as grandes corporações que dominam a economia.  Ao mesmo tempo, cria obstáculos intransponíveis para que novos valores e interesses sociais conquistem espaços nas instituições representativas. Hoje, no Brasil, governar é intermediar negócios. E o artigo primeiro da Constituição, em deslocamento trágico, pode ser lido de outra maneira: “todo poder emana dos financiadores de campanha e em seu nome está sendo exercido”.  Vale a pena transcrever alguns depoimentos altamente reveladores de tão dolorosa realidade.

José Roberto Arruda, filmado recebendo maços de dinheiro por ocasião do "mensalão" do DEM, depois de renunciar ao governo do Distrito Federal foi entrevistado pela edição on line da revista Veja. Diante da pergunta direta – o senhor é corrupto? - deu  a seguinte resposta: “infelizmente, joguei o jogo da política brasileira. As empresas e os lobistas ajudam nas campanhas para terem retorno, por meio de facilidades na obtenção de contratos com o governo ou outros negócios vantajosos. Ninguém se elege pela força de suas ideias, mas pelo tamanho do bolso. É preciso de muito dinheiro para aparecer bem no programa de TV. E as campanhas se reduziram a isso”.

Entrevistado pela Folha de São Paulo (10/11/2010), o neopetista André Vargas, aquele dos punhos cerrados contra o ministro Joaquim Barbosa e agora preso pela Lava-Jato, então reeleito na maior bancada federal do partido que recebera o maior volume de recursos das grandes corporações, declarou com conhecimento de causa:  "depois de uma eleição como esta, ou aprovamos o financiamento público ou permitimos que o deputado se vista como piloto de F-1, cheio de patrocínio pelo corpo".

O jornalista Marcelo Coelho, em artigo na Folha de São Paulo (12/12/2013), lista informações sobre gastos eleitorais: "dos 6 bilhões arrecadados nas eleições de 2010, 97% vieram de contribuições  feitas por pessoas jurídicas.  Tirania do poder econômico, ultraje à igualdade política, plutocratização do sistema político, rabo preso dos representantes". No dia seguinte, no mesmo jornal, artigo assinado por Fernando Rodrigues acrescenta outros dados: "Dilma elegeu-se em 2010 com doações de meras 1.842 fontes diferentes. Arrecadou 137,6 milhões.  Foram 1.513 pessoas físicas,  que doaram só 2% do total. E 329 empresas que entregaram para a petista 134,8 milhões, 98%!".

Oslain Santana, delegado da Polícia Federal especializado em crimes corporativos, em entrevista de página inteira em O Globo (20/20/2013), declarou: “quando você investiga um caso de corrupção, desvio de dinheiro público, vai ver lá na frente que tinha um viés para financiar campanha política. Então, se resolvessem fazer uma reforma política, diminuiria muito o crime de corrupção".

Depois de enfatizar que fala como "técnico", insiste: “esse sistema tem que mudar. Só o financiamento de pessoa jurídica, sem limites de gasto, não tem como fiscalizar isto. A justiça eleitoral não tem estrutura. A polícia não tem estrutura. Esse sistema que tem hoje é para facilitar o caixa dois de campanha.Uma proposta que achei bastante coerente foi colocar um limite para doação, só de pessoa física e parte do financiamento por recursos públicos. Sairia muito mais barato para a União o gasto com o financiamento, que o desvio de recursos públicos com as fraudes”.

Testemunhos semelhantes, aos milhares, poderiam ser listados. Qualquer cidadão que acompanhe os acontecimentos da nossa política sabe que o financiamento empresarial de campanha é um fator incontrolável de corrupção. O direito de votar, assegurado de maneira igualitária ao cidadão, só produzirá eficácia plena quando o "direito de ser votado" deixar de sofrer, como acontece agora, a interferência brutal do poder econômico.

Independente de outras deliberações importantes - voto facultativo ou obrigatório, sistema distrital ou proporcional, eleições entremeadas ou coincidentes -,  essa é a questão crucial. Não foi por acaso que, na farsa em curso no Congresso Nacional, onde se articula o retrocesso de uma contrarreforma política, foi neste tema que os conservadores se viram obrigados a atropelar o regimento para refazer uma votação perdida. O financiamento empresarial de campanha é a mola mestra da corrupção sistêmica.

Léo Lince é sociólogo.

quarta-feira, 10 de junho de 2015

Vídeo: TV UFBA – O PL 4330 e suas implicações no mundo do trabalho

UFBA (Universidade Federal da Bahia)

Alvo de muitas discussões, protestos e debates, o Projeto de Lei 4.330/04, que propõe regulamentação sobre terceirização do trabalho é tema deste Especial TV UFBA. Especialistas em Sociologia do Trabalho, como os pesquisadores Graça Druck, da UFBA, e Ricardo Antunes, da UNICAMP, e Isabela Fadul, da Faculdade de Direito da UFBA foram convidados para tratar sobre o projeto, que ainda tramita e será alvo de votação no Congresso Nacional e interessa a toda classe trabalhadora do país.

domingo, 7 de junho de 2015

O pior erro é achar que é impossível mudar as coisas. Por Gilberto Maringoni

Por;



Há um sentimento – que ganha concretude – nesses tempos ásperos.
ADVERTISEMENT
Trata-se do niilismo.

O niilismo sempre existiu.
É irmão gêmeo do cinismo, primo da desesperança e vizinho do desalento. Trabalha junto com o ceticismo.
Todos têm um ponto em comum; alegam não haver futuro. Dizem que estamos todos fodidos e – principalmente – mal pagos. Não há o que fazer. There is no alternative.
O formulador das teses niilistas geralmente fala em “nós”, mas se refere, na verdade, a uma terceira pessoa indeterminada.
A manifestação rasteira do niilismo sempre conclui que brasileiro é assim mesmo, que este país não tem jeito e que todo mundo é ladrão (especialmente os políticos, que nunca prestam). O Brasil de fato é uma merda, propagam.
O niilista defende o voto nulo. Diz não ser responsável por tudo o que está aí.
Nesses tempos em que o governo Dilma e o PT – que tantas esperanças despertaram há mais de três décadas – faz seu pouso – forçado? voluntário? prazeroso? – na pista do neoliberalismo e provoca uma decepção vertical, ressurge com força o niilismo.
Com uma diferença.
Vem agora como pretensa explicação para o desastre.
E aparece de roupa nova.
Emerge como vertente bem-pensante, com notas de rodapé e bibliografia nas últimas páginas.
Chega para dizer que não se deve confiar em políticos, em instituições e cita os teóricos iluminados dessa senda. Pode ser quem advoga mudar o mundo sem tomar o poder. Pode ser quem denuncia a “burocracia” partidária – da esquerda, claro! – numa leitura enviesada de cânones weberianos ou teóricos do “patrimonialismo” brasileiro.
Surge para dizer que nenhuma ação terá chance contra a maré montante ultraliberal, pois um ciclo se encerra, tudo o que foi construído nas últimas três décadas acabou, que é preciso formas novas de se fazer política (sem enunciar muito claramente do que se trata).
Nem tente mudar.
Nem tente planejar.
Nem tente organizar.
Nem tente tentar.
Nem tente, porque tudo já foi tentado e nada deu certo.
Acabaram-se as grandes narrativas.
O mundo é fragmentado.
O comportamento chega a ser visto como chique. Gera personagens eternamente blasés, charmosamente chatos, mas com aura de sapiência irrefreável.
O incrível é que diante da crise – política, econômica, social e cultural – o niilismo bem pensante nos reconforta.
Alivia nossa impotência, funciona como bálsamo para nossos fracassos e nos dá a impressão de já termos visto tudo nesta Terra. Já que nada dá certo, pelo menos o esforço de buscar saídas nos é poupado. Usemos nosso tempo para outras coisas.
Hoje, este é o principal inimigo a ser – racionalmente – combatido por quem quer construir alternativas.
O niilismo mata vontades, golpeia a inteligência e obscurece o futuro.
Não parece, mas nos desarma diante do avanço conservador.
Nos tira o chão diante de Dilmas, Lulas, Temers, Cunhas, Renans, Alckmins, Richas e outros prestidigitadores da vida pública.
Nos leva ao fatalismo paralisante.
Vou falar uma coisa bobamente militante aqui.
A hora é de tentar.
Não tentar por esporte ou por algum automatismo impessoal.
A hora é de tentar, pois como me falava um velho comunista bauruense, Alberto de Souza (1908-1992), teoria sem saída não nos serve. Por mais brilhante que pareça.
Ouvir sábios pregarem que o mundo é uma merda e seguirá sendo não paga a cera dos ouvidos que gastamos para escutar esse arrazoado.
Seu Alberto tinha motivos para falar isso.
Encarou a Revolução de 1924, mal tirado das calças curtas. Correu o Brasil na Coluna Prestes. Foi arrebentado na prisão, em 1935, de onde saiu para nunca mais conseguir andar.
Tornou-se um lutador e um organizador bravo e valente. Ajudou greves e mobilizações. No golpe de 1964, roubaram-lhe todos os livros. Perdeu amigos e camaradas.
Mas pode ver o ressurgir democrático nos anos 1970/80.
No quintal de sua casinha, na periferia bauruense, sentado numa cadeirinha de palha pegava um graveto, fazia um risco no chão, como um limite.
– Não presta quem diz que daqui ninguém passa. A gente passa ou morre tentando. É preciso saber transformar derrota em vitória. Quem não faz isso, melhor ficar em casa.
Seu Alberto mal concluíra o ensino fundamental. Mas pensava grande.
Não leu Gramsci. Mas exercitava o pessimismo da Razão e o otimismo da Vontade como poucos que conheci.
O mundo gira e a Lusitana roda.
Saída sempre há.
Pode não estar a vista.
Nesse caso precisa ser inventada. Usando as ferramentas de sempre – organização,ousadia, luta, inteligência – e sabendo-se o lado em que se está.
Não é fórmula e nem conselho.
Requer alguma prática e um tanto de habilidade.

Sobre o Autor
Gilberto Maringoni, professor de Relações Internacionais da UFABC e candidato do PSOL ao governo de São Paulo, em 2014

sábado, 6 de junho de 2015

A servidão involuntária

O que motiva os defensores da terceirização é a redução de salários, de custos e de direitos, "pejotizando" ainda mais as relações de trabalho
Desde os primórdios da humanidade a luta pela dignidade do trabalho tem sido prometeica. No Brasil, se o trabalho indígena foi um exercício comunal, a saga europeia do colonizador nos impôs o trabalho compulsório, inicialmente dos aborígenes e depois dos africanos.
Com a abolição da escravatura, o imigrante branco foi escolhido para o mundo industrial, excluindo-se os negros que povoavam a produção rural. E o trabalho negro, especialmente o das mulheres, foi empurrado para o emprego doméstico, perpetuando a herança servil da nova casa-grande urbana.
Foi a partir de 1930 que a modernização capitalista do país obrigou, depois de décadas de lutas operárias, a se pensar em uma legislação social protetora do trabalho.
De modo conflituoso e contraditório, nasceu a CLT, que tinha a aparência da dádiva, mas resultava de uma real impulsão operária. Converteu-se na verdadeira constituição do trabalho no Brasil, ainda que seus direitos excluíssem os assalariados do campo.
Hoje estamos à frente de um novo vilipêndio em relação aos direitos do trabalho, cujo significado e consequência têm requintes comparáveis à escravidão, ainda que em sua variante moderna. Descontentes com os direitos conquistados pela classe trabalhadora, neste contexto de crise, os capitais exigem a terceirização total, conforme consta do projeto de lei nº 4.330/04, agora rebatizado no Senado como projeto de lei da Câmara nº 30/2015.
Em nome da falaciosa "melhoria da qualidade do produto ou da prestação de serviço", o projeto elimina de uma só vez, a limitada disjuntiva existente entre atividades-meio e atividade-fim.
Uma empresa poderá recorrer a outra, para contratar trabalhadores, eliminando a relação direta entre empregador e assalariado. Como na escravidão. Neste passe de mágica, todas as modalidades de trabalho poderão ser terceirizadas. Até os pilotos de aeronaves.
Com um Congresso lépido e faceiro nas práticas negociais, impulsionado pela lógica volátil do capital financeiro, uma nova servidão involuntária está sendo urdida.
Dinheiro gerando mais dinheiro, na ponta fictícia do sistema financeirizado global e respaldado em uma miríade de formas pretéritas de trabalho (precarizado, flexibilizado, terceirizado, informalizado, "cooperado", escravo e semiescravo) na base da produção.
As falácias presentes no projeto de lei são todas conhecidas: em vez de criar empregos, ela desemprega, uma vez que os terceirizados trabalham mais tempo e ainda percebendo menores salários.
Em vez de "qualificar" e "especializar", temos o contrário, pois são nas atividades terceirizadas que se ampliam ainda mais os acidentes, as mutilações, os adoecimentos, os assédios, as mortes e os suicídios. Basta lembrar a indústria petrolífera e de energia elétrica.
Assim, o projeto de lei da Câmara não quer regulamentar os terceirizados, mas de fato desregulamentar o trabalho em geral. Se o quisesse, era só alterar seu o artigo 2º, eliminando a possibilidade de terceirização em "qualquer de suas atividades" e mantendo a regulamentação dos terceirizados que atuam nas atividades-meio. Simples assim, mas isso desmascara o real objetivo do famigerado projeto de lei.
O que motiva os seus defensores é de fato a redução salarial, de custos e de direitos da totalidade da classe trabalhadora, pejotizando ainda mais as relações de trabalho.
Já está mais do que hora de dizer --em alto e bom som-- que a terceirização avilta o trabalho em todas as suas formas e deve, por essa razão, ser combatida por todos.
É preciso acrescentar, porém, que o que está na pauta hoje é o risco iminente da terceirização total, inclusive das atividades-fim, que deve ser obstada para que não se gere ainda mais trabalho aviltado.
RICARDO ANTUNES, 62, é professor titular de sociologia da Unicamp. É autor de "Riqueza e Miséria do Trabalho no Brasil III" (Boitempo) e de "The Meanings of Work" (Os Sentidos do Trabalho), publicado na Índia pela editora Aakar Books

quinta-feira, 4 de junho de 2015

“Podem esperar mais mobilizações contra o ajuste fiscal”, afirma Guilherme Boulos

Em meio a ocupações urbanas que reúnem milhares de famílias, dirigente do MTST diz que ajuste fiscal compromete diretamente produção habitacional.
02/06/2015
Por Rafael Tatemoto
De São Paulo (SP)

No último mês de maio, o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) realizou três novas ocupações na região metropolitana de São Paulo. Segundo a coordenação do movimento, cerca de 6 mil famílias integram os novos acampamentos, localizados em Mauá, Embu das Artes e Itapecerica da Serra. O contexto em que surgem as ações é “resultado do modelo de cidade que exclui” e de cortes no orçamento federal na pasta de habitação, aponta o coordenador do movimento, Guilherme Boulos.
 
Movimento exige lançamento imediato do Minha Casa Minha Vida 3 | Fotos: Divulgação 
A ocupação Oziel Alves, de Mauá, realizou uma manifestação nesta terça-feira (2) na prefeitura do município. O protesto tinha como objetivo abrir negociações com a gestão municipal para garantir a construção de moradia popular na área ocupada.
Estão previstos mais protestos para a quarta-feira (3). As ocupações Paulo Freire, em Embu, e Maria Bonita, em Itapecerica, farão manifestações exigindo que a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) avance na emissão de licenças ambientais necessárias para a elaboração e aprovação de projetos habitacionais para as áreas.
Ajuste fiscal
Além das demandas de cada ocupação, as manifestações têm um alvo político em comum: o ajuste fiscal promovido pelo governo federal. “[O ajuste] está afetando diretamente a questão da moradia. O Ministério das Cidades foi a pasta que recebeu o maior corte”, afirma Boulos. “Neste momento, as ocupações e manifestações têm um objetivo claro: pressionar o governo para lançar o Minha Casa Minha Vida 3 imediatamente”, enfatiza o coordenador do MTST.
Para ele, caso o ajuste prossiga, uma pressão cada vez maior sobre as cidades ocorrerá, fazendo com que a demanda por moradia popular aumente. Os dados parecem comprovar essa visão: além do “atraso” no Minha Casa Minha Vida, os juros para crédito imobiliário aumentaram e as próprias empreiteiras têm tido dificuldades devido ao avanço da taxa básica de juros.
Nesse novo cenário, o movimento promete não só manter como intensificar sua luta. “Contra esse ajuste antipopular, da parte do MTST, podem esperar mais mobilizações.”