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quinta-feira, 1 de novembro de 2012

A política do extermínio no Estado de São Paulo

Postado: http://www.ivanvalente.com.br

Senhor Presidente, senhoras e senhores Deputados,

Venho à Tribuna neste momento para expressar toda a nossa preocupação com a brutal onda de violência que atinge a cidade de São Paulo. Os assassinatos recrudesceram nas últimas semanas, mas os números vem crescendo desde o início do ano, sem que o poder público paulista tenha sido capaz de dar uma resposta consequente com as causas dessa situação.

A imprensa tem batido diariamente na tecla dos ataques contra policiais. Mais de 80 foram mortos desde o começo de 2012. Tais crimes devem ser investigados e os responsáveis, punidos. No entanto, há uma outra onda de violência, maior do que os assassinatos dos policiais, porém silenciosa – ao menos para os microfones da grande mídia. Me refiro à execução de jovens, em sua imensa maioria negros, que vivem nas periferias da capital, no interior e na Baixada Santista, e que tem sido mortos em dois contextos que também requerem explicações e para os quais não podemos fechar os olhos: o ataque de grupos de extermínio e a resistência seguida de morte em supostos confrontos com a polícia militar.

Foram mais de 90 mortes nos últimos 20 dias. Na Baixada, as Mães de Maio passaram o dia das eleições no IML buscando a liberação de corpos. Nos últimos dois dias, mais de dez pessoas morreram nessas situações, sendo que três das vítimas eram moradores de rua – ou seja, pessoas que não estavam participando de nenhum ataque a policiais. Os relatos falam de homens encapuzados em motos e carros pretos, que chegam disparando. Os tiros tem alvo certo: a cabeça. Uma das avaliações do Comitê Contra o Genocídio da Juventude Negra, que reúne mais de 30 organizações de defesa dos direitos humanos, fala de dez civis mortos para cada policial morto este ano. A proporção é assustadora.

As entidades apontam para a existência de uma política deliberada de grupos de extermínio dentro dos batalhões da Polícia no estado de São Paulo, sobre as quais praticamente nada tem sido dito e que tem resultado na matança de civis inocentes e de supostos suspeitos. Nesta quarta, os governos federal e de São Paulo bateram boca publicamente; enquanto o primeiro dizia que tinha oferecido ajuda da Polícia Federal para São Paulo, o segundo rebatia que não. Enquanto isso, mais jovens eram assassinados de maneira inexplicável.

No último dia 17, o Comitê Paulista pela Memória, Verdade e Justiça, em parceria com outras organizações, enviou ao ministro da Justiça e ao Procurador-geral da República uma carta em que denuncia a ação da PM e de grupos de extermínio a ela vinculados. Segundo dados da Secretaria de Segurança Pública, de janeiro a agosto de 2012, a Polícia Militar matou oficialmente 338 pessoas. Somente em agosto foram 67 mortes, 80% a mais do que no mesmo período de 2011. Mas se estima que esse número seja muito maior, pois nesta cifra não estão computados os casos de “resistência seguida de morte”, tampouco as mortes praticadas por tais grupos.

A resposta do governo tucano para os ataques contra os policiais foi a mesma de sempre: aumentar a repressão. Partindo do princípio que se trata de uma guerra de bandidos organizados contra a polícia, a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo colocou em curso operações de ocupação de favelas na capital. Oficialmente, estão procurando os responsáveis pelas mortes dos PMs. Vimos um filme muito parecido com este em maio de 2006.

As denúncias de truculência e abuso policial em uma das operações, em Paraisópolis, com 600 homens, não param de pipocar. Cerca de 80 mil pessoas vivem na comunidade, e o clima de terror está instalado. Os tucanos negam, mas há dias os bairros vem sofrendo toques de recolher impostos ilegalmente – já que não teriam autorização superior – pelos policiais. A população pobre está sitiada e tem reclamado que os PMs tem entrado nas casas a botinadas. A imprensa também confirmou a ação de PMs com farda sem identificação, prática – também ilegal – que já se tornou de praxe nas ações da corporação em São Paulo.

Na avaliação do Núcleo de Estudos da Violência da USP (Universidade de São Paulo), a ação repressiva da polícia pode até surtir um efeito no curto prazo para o caso dos ataques criminosos a PMs, mas a médio e longo tende a produzir outras crises. Para o NEV, o governo Alckmin deveria explicitar que não concorda com retaliação da Polícia Militar e que PMs envolvidos em crimes também serão investigados. Fora isso, o Estado precisa estar presente nas periferias não com o aparato repressor da polícia, mas através de saúde, jurídico e outras instâncias. Enquanto a política de segurança for investimento na PM e em aumento dos presídios, não vamos sair desses ciclos. Segundo os especialistas da USP, ações como a que estão sendo feitas em Paraisópolis não são novidade e não estão resolvendo.

Desde 2010 organizações da sociedade civil paulista pedem a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Assembleia Legislativa do estado sobre a violência policial. Dados da Anistia Internacional revelam que, em 2011, o número de mortes por autos de resistência apenas no Rio de Janeiro e São Paulo foi 42,16% maior do que todas as penas de morte executadas, após o devido processo legal, em 20 países. O Mapa da Violência 2012 indica ainda que entre 2001 e 2010 o número de vítimas brancas, de 15 a 24 anos, caiu 27,5%, enquanto o índice de negros assassinados aumentou 23,4%. Anualmente morrem 139% mais negros do que brancos na faixa dos 15 a 24 anos.

Esta semana o Comitê Contra o Genocídio da Juventude Negra se reuniu novamente para organizar uma série de ações em contraponto à violência, que está atingindo números de guerra em São Paulo. Haverá uma série de mobilizações em datas simbólicas para os movimentos – como 20 de Novembro, Dia da Consciência Negra, e 10 de Dezembro, Dia dos Direitos Humanos -, audiências públicas e medidas de solidariedade e apoio às famílias das vítimas, inclusive dos policiais mortos pelo crime organizado.

O PSOL se soma a este esforço e mais uma vez vem a público cobrar do governo Alckmin, além de uma explicação convincente e responsável sobre a epidemia de mortes em São Paulo, uma mudança urgente na política de segurança estadual. Os responsáveis pelos crimes – contra os policiais e contra a população – precisam ser punidos. Mas aumentar a repressão contra as comunidades, multiplicar as operações de saturação, aumentando o clima de pânico e os abusos policiais nas comunidades, tendo como única consequencia a explosão dos assassinatos e o encarceramento em massa, é uma prática fadada ao insucesso. A resposta tem que ser outra.

Muito obrigado.
Ivan Valente
Deputado Federal PSOL/SP

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